SINCERICÍDIOS


Eu assino a Folha de São Paulo. No começo do ano 2014, mas precisamente em março, Ruy Castro, que admiro como colunista e escritor, escreveu: “Há anos não ouvia a palavra sincericídio." Diz ele mais:(...) “consiste em alguém dizer o que pensa, mas em momento e circunstância impróprios. É um impulso, um lapso, uma gafe. O sincericida fala sabendo que está sendo ouvido. Se arrepende, mas aí é tarde.”

Ruy fala também – umas palavras que pincei aleatoriamente: que, às vezes um falso amigo ao ouvir algo sobre alguém, pode praticar algum “contorcionismo semântico” e adaptar ao seu sincericídio, transformando em uma pecha que gruda pegajosamente na vítima a ponto do arrependimento, desculpas, principalmente à mulher do infeliz que recebeu o sincericídio, não ter mais conserto, às vezes fica sem volta.

O que Ruy Castro também cita são os “sincericídios mamutes” cometidos pela dupla Dilma e Lula, ela ao culpar a equipe da Petrobras como culpados da compra “do barco furado Pasadena”. “Mas como poderiam ser culpados se, na época a própria Presidente, os elogiara fartamente e os promovera? Quanto ao Lula, o mesmo disse que sua pupila tinha dado ‘ um tiro no pé’. A dizer isso, Lula também cometeu sincericídio. Era como chamar sua pupila de burra.” Depois remendou com pano novo a camisa velha. É bem isso o tal de sincericídio.

Ser uma pessoa sincera na maioria das vezes é tida como possuidora de uma virtude, ser sincero, requer muito cuidado e respeito. O que irei contar, dizer, o segredo que vou revelar ou a opinião que emitirei terá alguma utilidade? Fará algum bem à comunidade, à humanidade ou à pessoa que me referir? Não! É, analisemos bem, uma maldade.

Ser sincero, não arrefecer perante uma flagrante verdade, como foi dito, é em certos casos apaludido até como um virtuoso. Mas em pleno salão de festa, se uma amiga olha bem para o vestido da outra e diz: - Querida, esse vestido e essa cor, me desculpe, não tem nada a ver com o uso à noite e com a festa, mas se você está confortável... Diante de dezenas de outros convidados! Esta criatura enxovalhada, irá chorar no banheiro e em seguida se retirar.

Entre homens: Carlos está com a esposa em uma festa e o seu amigo Rafa chega e em bom som diz: - Quem diria hein Carlos!? Disseram lá na empresa que você é o maior garanhão, passou de quarenta quilos, o coração está batendo você CRAU! Não perdoa mesmo! Parabéns cara. Macho tem que ser MACHO!! E se vai, enturmado com outros, bebendo umas e outras...

Como fica a vida desse infeliz agora, e na frente da esposa. Como se defender desse sincericídio que pode ser, oriundo de uma “armação”, uma “pegadinha” em que o Rafa “embarcou” e como comete os tais sincericídios, Carlos foi sua vítima.

Isso pode destruir um casamento, uma família, uma vida, causar um suicídio do homem, se a mulher for daquelas cujo ciúme esguicha pelos olhos e sem confirmação nenhuma, sem explicações; por muito menos, por insignificâncias, vai para a casa da mamãe e só com rios de velas e promessas, é que volta para casa... O Carlos estará terminantemente perdido.

Não podemos e não devemos, sair por aí e falar aquilo que nos der na telha, em nome de nossa consagrada e solene sinceridade. Ser daqueles que falam: - Me desculpem, mas eu sou muito sincero!... Podemos ser sinceros com as pessoas com as quais temos maior intimidade e conhecemos a personalidade a fundo; mas mesmo assim em particular – como devem proceder os amigos. Por exemplo: - André, eu acho que você já bebeu o suficiente, já está meio “passado”; é melhor dar “um breque”. Mesmo assim nem sempre a sinceridade é bem vinda ou aceita por quem está errando...

Podemos ser sinceros com as pessoas que sabemos, ou pelo menos acreditamos que não sofrerão com aquilo que vamos falar, e também do jeito que devemos falar, sem agressividade autoritária, pois conforme o caso nós vamos entornar o caldo em vez de ajudar.

Com esta pseuda sinceridade, o sincericídio, onde sua amplitude excede a definição de sinceridade e recai por necessária no neologismo - já assimilado – do sincericídio; você não obtém mérito algum, não move um átomo sequer do universo a seu favor ao utilizar desse expediente: uma “verdade” que passa a ser injuriosa e poderá destruir a vida de uma pessoa (ou várias) para sempre.

Para que não haja um suicídio causado por um sincericídio aqueles com vocação de sincericidas, que leiam isto ou outra fonte, e reflitam bem antes de abrir o oráculo da sinceridade.


 
Mauro Martins Santos
Enviado por Mauro Martins Santos em 09/01/2015
Reeditado em 10/01/2015
Código do texto: T5095727
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