SOBRE O ENCONTRO DE HOJE À TARDE ENTRE EU, ELA E O LIVRO

Só treinando os olhos para que eu possa enxergar com mais precisão o que essa danada esconde em seu nevoeiro obscuro. Aparentemente não enxergo um palmo à minha distância, principalmente em relação a tudo aquilo que procuro viver ainda que só por um encontro. A cada segundo que passa a sensação é de estar mais próximo de sua materialidade que reserva o tempo e a experiência de saber que vem coisa nova por aí. Ainda é cedo para apalpar qual quer que sejam os resultados daquilo que cotidianamente construímos. Os tropeços foram inevitáveis influenciados pela falta de confiança sobre aquilo que você é ou sobre qual caminho seguir. Sinto materializar algo a minha frente, meus sentidos não falham tão facilmente, e mesmo que enganados, farejam seus suspiros que dissipam à diante à nevoa que à cerca. Sim. Ela retorna ainda com mais força que da última vez. A confiança que sinto em minha corrente sanguínea é ainda mais forte que minha vontade de agir ou deixar ser envolvido por ela. Sinto seu soberbo perfume adocicado que parece exalar de seus poros femininos que veem de encontro contra esse pobre mortal que contou os segundos para revê-la. Parece-me abater agora, mais do nunca um certo frio na barriga que faz o processo do bate e volta, como na forma da reciprocidade entre dois bons amigos. Diria mais. Com apenas um toque em sua pele seria possível sonhar um número considerável de vezes, descobrindo e redescobrindo suas expressões faciais, jeitos e trejeitos de como se expressa e se deixa envolver. Parece-me este, um momento desconhecido por ambos à vista de todo o nosso despreparo um para com o outro. Não há diálogos, tão pouco esclarecimentos sobre nossas relações futuras. Fica tudo por conta do acaso. Assim é entre eu e ela. Mesmo estarrecido com todo seu mistério e a pouco já cansado dessa troca de olhares, posso dizer que ainda existe muito o que conversar, mesmo que pelos olhos, descobrindo um ao outro sem que tenhamos ainda, trocado uma só palavra. De fato há muito que comunicar sobre os olhares que desconhecemos ou deixamos escapar ao acaso de nossas obrigações cotidianas. A vi apenas uma vez, entre os livros que nos separavam como se pertencêssemos a mundos completamente diferentes. Mas foi assim que passei a conhecer um pouco mais sobre a garota misteriosa que me vigiava por entre as pratilheiras empoeiradas do sebo da rua quinze. Posso jamais encontrá-la daquele seu jeito único. Todo esse processual evento durou apenas um segundo. O suficiente para que eu me apaixonasse perdidamente por aqueles olhos negros que me vigiavam e transbordavam mistério e sedução. Nem pude perguntar ao menos seu nome. Percebo que acabo de retornar a realidade que ofuscou sua fisionomia em meio ao sopro tentador daquele velho e empoeirado livro. Assim como a poeira se dissipa pelo ar, vejo nossos destinos convergir para histórias diferentes. O nome do livro que esteve em minhas mãos e agora passa a compor minha biblioteca era "Cinco histórias convergentes". Olho ao meu redor e percebo que só haviam cinco pessoas, neste que por hora tornou-se para eu, obra rara do acaso tentando me seduzir com suas peças já manjadas por todos.

Jack Solares
Enviado por Jack Solares em 09/01/2015
Código do texto: T5095536
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