Saudades do meu tempo de Movimento Estudantil
Parece um assunto meio chato, quando alguém (ou eu) se propõe a falar sobre política. Surgem as imagens de pessoas sem o espírito da defesa do bem-comum. São construídas imagens negativas e pejorativas, desde as claques organizadas em torno de um grupo ou de um líder até às práticas em nada úteis, como o acúmulo ilícito, a falta do uso da verdade, etc.
Quero falar da minha experiência na política estudantil de uma forma bem intimista, em oposição à visão maçante que certos neuróticos ultra-esquerdistas (associados ao trotskismo desvairado do PSOL e do PSTU) tentavam imprimir aos estudantes. Quero, a partir da minha experiência pessoal, colocar os bons momentos (e os maus também) que pude vivenciar...
Ao entrar na UFRJ, confesso que jamais havia participado de qualquer movimento político organizado. Nunca tive qualquer contato com o movimento secundarista e, ao chegar na primeira reunião do Centro Acadêmico (CA) de História, via gente rodada e experiente no Movimento Estudantil. É verdade... se quisesse alçar a algum lugar com as minhas propostas e visões sobre a universidade ideal, teria que enfrentar gente com forte preparo intelectual e político-ideológico. Gente da antiga Democracia Socialista do PT (DS - hoje, considerável parte se encontra no PSOL) e do PSTU tomavam a hegemonia política do Centro Acadêmico, uma vez que a DS era o "satélite político" do PSTU.
Tirar os carinhas do PSTU não era fácil. Confrontava-me diretamente com eles, nas reuniões ou nas "políticas dos corredores", cooptando e buscando o apoio dos alunos independentes ou até de alunos que nutriam alguma simpatia pelos integrantes do PSTU, mas que, volta e meia, ficavam insatisfeitos com alguns rumos da gestão do CA. Particularmente, admirava o arrojo e a desenvoltura teórica deles e a sua capacidade de mobilização. A mim, sem uma base sólida definida, era obrigado (por bem ou por mal) a ir constantemente à Biblioteca da faculdade para consultar obras de História Social e Política e de Ciência Política e Sociologia, para compensar meu déficit intelectual.
Lendo gradualmente, pouco a pouco percebi que, tirando uns três ou quatro militantes do PSTU bem preparados, os demais reproduziam porca e tortamente o Manifesto Comunista de Marx, em uma leitura anacrônica e em um marxismo determinista de doer, esquecendo de ler os clássicos de Lênin, Gramsci, Althusser, Lukacs, dentre outros teóricos marxistas ou mesmo os grandes cientistas políticos, como Norberto Bobbio.
Aliado a essas contradições e mais o perfil de "estudantes profissionais" que muitos deles tinham (só iam à faculdade para fazer provas e militar no movimento estudantil nas eleições), com seus coeficientes de rendimento (isto é, notas) baixíssimos, tratei de compor uma chapa de oposição, junto com o Júlian Serrazine, Rodrigo Barros e o David José (particularmente, dois grandes amigos pessoais). Explorando as deficiências de um CA partidarizado e de uma gestão inepta, com gente despreparada e sem representar os estudantes, fizemos a nossa campanha. É bem verdade que, diferente dos panfletos e adesivos bem elaborados da chapa PSTU-DS bancados pelos seus partidos, tínhamos que gastar do nosso próprio bolso para tirar a xérox do nosso material para os estudantes e fazer um milhar de adesivos simples (ruins, por sinal). No entanto, creio eu, foi a eleição mais disputada que vi em toda a minha vida, onde perdemos apenas por 11 votos de diferença. Por ironia, na primeira recontagem, eles haviam ganhado por 13 votos e após protestarem, pedindo a recontagem, só ganharam por 11 votos. Como o sistema era a proporcionalidade, praticamente metade das vagas eram nossas.
Foi assim que começou a minha ascensão "meteórica" no movimento estudantil na UFRJ. Mais tarde me filiaria ao PDT e, a partir da minha atuação de coerência, em defesa dos estudantes, sem os vícios caquéticos da oposição, granjeei muitos apoios e por eles que, nas eleições para o Diretório Central dos Estudantes da UFRJ (DCE), ajudei a puxar muito voto do meu curso e de outros conhecidos meus de outros cursos, vencendo com o sistema majoritário.
Foram tempos bons. Tempos em que conheci muita gente boa e picareta também. Entre fisiológicos e ideológicos, oportunistas e idealistas, pude ver, no microcosmo do movimento estudantil da UFRJ, a "escola" política que se reproduz no país, em uma cultura de sabotadores e altruístas. Longe da alardeada luta de classes, havia sim, uma luta de egos, entre alguns "caciques" políticos e dos cursos com peso político-eleitoral.
Gente muito boa vi, é verdade. Everton Gomes, Flavinha Calé, Daniel Baiano, Huguinho Araújo, Jefferson, "Léo" Madeira de Lei, Jefferson Caldas, Daniel Iliescu, Bernardo Lima, Anna Carolina, Demian Melo, Rodrigo Palácio, "Mukito", Moisés Mahlabi, Júlian Serrazine, Fábio Samu, etc, etc... seria injusto demais numerar nome por nome e esquecer dos meus amigos e companheiros, entre aliados e adversários que pude desfrutar nos diversos embates e que me motivaram a ser o que sou, em meu humilde arcabouço político-ideológico, fazendo ser o que sou.
Entre lutas, conquistas e frustrações, pude perceber o lado lindo e, ao mesmo tempo, indiferente do movimento estudantil. A tarefa é árdua, altruísta e nobre, porém às vezes sem glória e sem reconhecimento dos estudantes. Talvez, pela mentalidade individualista disseminada pela mídia em geral, não se vê com bons olhos mais a nobreza em lutar por uma causa justa que beneficie o coletivo. E tive, infelizmente, um pouco desse desprazer.
Creio eu... um dos momentos mais marcantes que não vou esquecer.