Sinais de Cansaço

- Sente-se, por favor! - Obrigada! Doutor Goia observou que a paciente tinha alguma coisa fechada na mão, pelo odor que vinha dela era possível também notar que não havia se higienizado naquele dia. – Dona Marcilia tem alguma coisa escondida na mão que queira mostrar-me? – Tenho sim! Minha calcinha com sangue de mestruação, que estou guardando para entregar ao meu marido! – Mas a senhora não é casada dona Marcilia, ontem dissera que sonhava em arranjar alguém na sua vida, lembra? – Já me casei com ele, foi esta noite nos meus sonhos! – Ah ta! Eu posso saber o nome dele? – Pode. O Psiquiatra conversava com a paciente e folheava o seu prontuário buscando mais informações, de repente parou apertando os óculos de lentes grossas e retangulares fixou a vista numa das páginas e chamou alguém pelo telefone. – Pois não Doutor! – Fauna, quem fez esta anotação aqui? – Não sei a letra não é minha? – Não estou perguntando se a letra é sua, você é a responsável pelo setor e isto vai dar galho! Quero saber apenas quem escreveu, só isto! O semblante da Enfermeira mudou-se adquirindo manchas escuras em volta dos olhos e um suor repentino deslizou pelas faces. – Ela vai morrer! Disse à paciente que encarava tranquila a mutação da enfermeira. – O que é isso Fauna! Fauna, Fauna! Os chamados do medico passavam como soprados sem efeito algum no inconsciente da moça, que a cada instante adquiria manchas ainda maiores. – Ela vai morrer! Repetia Dona Marcilia balançando a cabeça para os lados sob o desespero do Psiquiatra que ligava para um numero insistentemente sem obter resposta. – Só tem ela e o senhor dentro do hospital, todo mundo já morreu! – Cala sua boca porra! Se não lhe mando para o choque. Vociferou o medico irritado se levantando em frente à paciente, voltando a insistir no telefone. – Não adianta ninguém vai atender ao telefone, o senhor também vai morrer! Ela já está morrendo, meu marido disse que eu herdaria todas as almas! Uma lufada de vento entrou pela janela trancada e derrubou os papéis que estavam sobre a mesa, Dona Marcilia olhou para um canto da parede estendendo a mão que estava fechada segurando a calcinha suja, sorriu e como se abraçasse alguém deu mais alguns passos para o canto, levantou a camisola que usava e agachou iniciando movimentos inconstantes como se copulasse em altos gemidos. A enfermeira se contorcia para o lado esquerdo, deixava cair da sua boca um liquido amarelado cheirando a creolina, o pavor se apossou do Psiquiatra que batia o telefone com força tentando chamar alguém até que o aparelho se despedaçasse no chão, do piso encerado surgiram fendas e línguas de fogo saíram lambendo o teto, Fauna com seu corpo em forma de parafuso foi puxada para baixo, sem antes ser consumida pelas chamas, no canto Dona Marcilia pulava e chamava pelo nome de um personagem que Doutor Goia se lembrava de ter lido em conto de Stephen King. O fogo transformou-se em um ser com hidrocefalia de dentes pontiagudos e olhos anictericos, tinha cheiro de podre e uivava como lobo, feito Sucuri faminta engoliu a enfermeira sob os gritos pavorosos do Psiquiatra. – Nãããão! Meu Deus o que é isto?! Socoooorro! – Doutor, Doutor Goia! Está tudo bem? Os olhos assustados do Psiquiatra se levantaram e depararam com a enfermeira sentada a sua frente com um prontuário na mão, do seu lado Dona Marcilia de cabelos penteados cheirando a sabonete phebo. Numa rápida vistoria com os movimentos alternados da cabeça notou que o chão estava em ordem, os papéis no mesmo lugar e o telefone estava inteiro no canto da mesa. – Para onde ela está indo? – Como assim Doutor Goia, o senhor acabou de pedir que ela se arrumasse para assinar à alta, aqui está o prontuário com o receituário como o senhor pediu. – Uai Doutor parece que o senhor está ficando doido também. – Cansaço gente, cansaço! Plantão de trinta e seis horas dá nisso! Boa sorte e não se esqueça de tomar os remédios direitinho viu! – Sim Doutor vou tomar sim! Fauna bateu a porta e saiu com a paciente rumo ao portão de saída, no final do corredor ao notarem que o medico as observava Dona Marcilia retirou o papel da alta da bolsa e abriu na frente da enfermeira, com o olho nas letras, mas percebendo aquele vulto, disse com a boca semi aberta, - Faça o sinal da cruz três vezes ao passar por ele, com o giz branco reforce a estrela de cinco pontas da encruzilhada dos corredores, seja forte!