Dentro do elevador

Por duas vezes aconteceu de eu entrar no elevador e, ao me deparar com pessoas em silêncio, com ar grave e compungido, soltar um “meus pêsames”, em vez do protocolar “bom dia” ou “boa tarde”. A primeira impressão que tenho é realmente a de que alguém morreu. Demoro a perceber que não se trata de um velório, mas do habitual subir-e-descer de quem tem a ventura de trabalhar em um prédio. E ali, dentro do elevador, dou-me conta de que fracassamos, nós todos, como humanidade, como espécie ou coisa que o valha. Porque se estamos tão constrangidos é porque não suportamos ficar próximos a pessoas que não conhecemos. Não somos como os cachorros, que reconhecem uns aos outros e começam a se cheirar. Somos humanos e desconfiados, não nos alegramos por encontrar alguém semelhante a nós. Por isso nos custa tanto andar de elevador.

Ainda bem que inventaram aquelas televisões de elevador, então todos podem erguer a cabeça e se fingir compenetrados, sem obrigação de travar contato uns com os outros. E sempre existe a possibilidade de mexer no celular, mesmo que ele não funcione direito dentro do elevador. Na falta disso, mantemo-nos solenes e distantes, balbuciando alguns cumprimentos para que não nos tomem por mal-educados, e torcendo para que o elevador não estrague.

Outro dia reparei naquele aviso na entrada dos elevadores, dizendo que, antes de entrar, devemos nos certificar de que o elevador está parado no andar. E logo abaixo vem o número de uma lei qualquer. Fiquei pensando: o sujeito não se certifica, cai no fosso do elevador, morre ou se fere gravemente – e ainda tem que responder por um crime!

Há algum tempo eu tive a chance de pegar o elevador sozinho com uma moça muito, mas muito bonita mesmo, que trabalha no mesmo prédio que eu. Precisei disfarçar o meu embasbacamento. Eu nem mesmo tinha coragem de olhá-la. Pois de repente foi a moça bonita que olhou fixamente para mim. E também foi ela quem puxou conversa:

- Tem alguma coisa no seu queixo... pasta de dente, parece...

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 05/01/2015
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