CORDÃO UMBILICAL NÃO ROMPIDO.
Viviam na rua
por vezes amotinados,
por vezes desparafusados de si mesmos.
Devia ter uns trinta, quem sabe até quarenta,
o tempo não corteja todos com a mesma mão
pra uns é lírico, pra outros, áspero.
Viviam na rua entre cuspes e restos dos restos dos restos
não viviam sós, não mesmo.
Aquele cão era sombra viva dele.
Cordão umbilical nunca foi rompido
talvez sua melhor parte, a mais querida, a mais linda.
Os dois não tinham raiz, nem frutos, nem rebarbas.
Se atracaram certa vez e nunca desligaram esse mar.
Eram alma e alma costuradas com cuidado, com carinho, com amor, com fé.
Assim foram adiante nesse folhetim que chamam de vida.
Tinha vez que chovia, o mundo parecia que estava dizendo adeus.
Tinha vez que o calor chicoteava sem perdão. Como doía, como doía.
Tinha vez que choraram juntos até as lágrimas virarem um rio só.
Eram felizes nesse traçado ríspido, nessa cárie a céu aberto que não dá sossego.
Talvez sejam as duas criaturas mais felizes nesse chão que chamam de Terra.
Porque um tinha o outro sem pedir resgate. Sem ter que pedir desculpa
e nem perdão.
Sem ter que pedir nada.
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