Deus nasceu no exílio
Este é o título da famosa obra de Vintila Horia: “Dieu est né en exil”, que descreve o prestígio do poeta Ovídio na então sociedade romana. Por isto, o Imperador Augusto impôs a esse bardo o exílio, onde morreu sem retornar a Roma. Exilado, sofreu constrangimentos e imensa saudade da pátria. Comenta o escritor Vintila Horia sobre a expatriação involuntária: “Pode-se morrer, antes de estar definitivamente morto”. Fugiram José e Maria da sua terra para evitar a perseguição do edital do monarca que mataria todos os recém-nascidos. “Ao chegarem à cidade de Belém, não havia lugar para eles na hospedaria (Luc 2,7)”. Mesmo possuindo moedas, que ganhara como carpinteiro, José não conseguiu achar pousada para acomodar sua esposa grávida. Hospedaram-se num estábulo, e sobre o feno adormeceu o recém-nascido. Os reis magos ouviam a natureza, olhavam as estrelas; bois e ovelhas regressavam do pasto; a mãe cerzia pedaços de pano para cobrir o Menino Deus; o teto de palhas deixava passar luz da lua; calaram-se os grilos, na natureza aconteceu um misterioso silêncio; emanaram os aromas dos incensos e mirra que, conforme a dança do vento, alternavam-se com o cheiro da estribaria; uma áurea luz fez o menino abrir os olhos, para observar que, na simplicidade do estábulo ou no desconforto do exílio, cumpriam-se as profecias.
Anualmente, em Pilar, meu padrinho Severino Barbosa me dava dinheiro para comprar brinquedos. Pensava, então, que quando meu padrinho morresse, os natais se acabariam... Mas, não. Dias atrás, as donas de casa desembrulharam enfeites, lâmpadas chinesas, bolas de vidro e bonecos para instalar seus presépios. Armaram um pinheiro, cobrindo-o de algodão para simular neve, para ser “árvore de natal”. Da casa, as preparações saíram à rua, enfeitaram postes, vitrines, lojas e supermercados; ao som de “noite feliz”, os caixas, vestidos de Papai Noel, olhando o próximo da fila, balbuciam:“Feliz Ano Novo!”. Num corredor, um Papai Noel, tristonho, cansado, distribui prospectos de edifícios e de promoções das iguarias natalinas no supermercado. Nesses retratos da vida, há automatismo no ar... Protesta o poeta Drummond contra a industrialização do sagrado tema e pede a Deus não fazer poesia: “Menino, peço-te a graça / de não fazer mais poema de natal. / Uns dois ou três, inda passa... / industrializar o tema, / eis o mal”. Com desvirtuamento do natal, Deus continua nascendo exilado, distanciado de nós, em terras longínquas...