PRESENTE DE NATAL
Quem é que não gostaria de receber um presente? E se a data for Natal? Melhor ainda, não é mesmo?
O presente é sempre uma dádiva, uma oferta em sinal de apreciação. O presente pode ser tudo, um abraço, um sorriso, uma palavra amiga, e até você presente.
Quando visitava a casa de repouso para idosos me aprazia muito conversar longamente com o simpático senhor Fran. Descendente de alemães beirava os noventa anos. Cego desde muito jovem não reclamava desta situação, e sim da falta que o neto lhe fazia.
Contou-me que ha vinte anos passados vivia feliz com seu netinho Pedro de quatro anos. Embora cego ele possuía uma habilidade incrível de narrar lindas histórias como ninguém; ensinava ler, escrever e tinha seu neto sob sua constante vigilância.
Entre avô e neto existia uma unidade muito forte. Era como se dois espíritos comungassem dos mesmos elos, dos mesmos desejos, dos mesmos bem querer.
Um dia, através de denúncia, a justiça veio tirar o pequeno Pedro dos braços de seu avô.
- Foi como se tirassem um pedaço de mim; foi muito triste. Contou-me ele.
- O senhor não tem condições de cuidar de uma criança! Dizia o homem da lei. Ele vai ficar muito bem aonde vamos levá-lo.
A cena era comovente, mas os homens da lei permaneciam totalmente impassíveis e cruéis.
Vô e neto entrelaçados, num abraço apertado não se desgrudavam.
Pedro tremia e chorava convulsivamente sem nada entender.
- Não quero ir! Quero ficar com meu vozinho! Dizia gritando o netinho.
- Deixe-me, deixe-me! Gritava desesperado o menino!
Inconsolável, sem forças para conter a brutalidade daqueles homens, foi desenlaçado do abraço do neto, e soluçando enxugou com a manga da camisa suas lágrimas lamentando.
- Não levem o menino de mim! Por favor deixe-o comigo! Para aonde estão levando o meu Pedrinho?
Foram inúteis seus apelos.
Ainda ouviu ao longe os gritos de seu neto, quase abafado pelo ruído do carro que se afastava.
- Quero ficar! Quero meu vozinho! Deixe-me, deixe-me, por favor!
Alguns dias depois, sem saber o paradeiro de seu Pedrinho, desalmadamente colocaram-no num abrigo para idosos.
Os anos passaram, mas não curou as feridas da separação, apenas sulcaram em seu rosto as rugas da saudade.
Quando alguém perguntava para ele o que mais gostaria de ganhar no Natal, respondia esperançoso.
- Dar um abraço e um beijo no meu Pedrinho.
Aquela figura simpática, magra, cabelos em neve, mal podendo se manter em suas pernas me emocionava as lágrimas pela esperança incontida que alimentava.
Passavam-se os natais, muitos deles, e o abraço tão desejado como presente não vinha, mas a esperança transformava o desejo desse momento, único e estático, num sonho imenso de realizações.
Aquele Natal não foi diferente.
- Ah! O presente? Suspirava longamente dizendo:
- Rever meu netinho e dar um abraço bem apertado nele!
Aquela tarde estava morna e linda como só nos natais podem estar. O rebuliço no ambiente demonstrava alguma coisa diferente.
Muitos cochichos e sorrisos nos lábios.
Um jovem, bem apessoado parou na porta do quarto do seu Fran, olhou-o demoradamente, como num ato de reconhecimento, e não se contendo, num sorriso desconcertado enxugou algumas lágrimas.
E no mesmo instante...
Seu Fran ergueu a cabeça, dirigiu seus olhos cegos para a porta, e como se estivesse vendo alguma coisa fantástica, linda, muito importante, sorriu meio engasgado dizendo:
- Meu Pedrinho, é você? Até que enfim você voltou!
Muita gente afirma que nesse momento viu uma intensa e brilhante luz que envolveu os dois.
Abraçaram-se longamente, num abraço apertado como se fosse uma união de espíritos que finalmente se reencontram.
O povo emocionado aplaudiu.
Pedro, ainda abraçado, soluçando, diz baixinho no ouvido de seu avô.
- Vozinho, vou levá-lo comigo, ninguém mais vai nos separar!