A RENÚNCIA DO PAPA BENTO XVI
Já vencida a primeira década do século vinte e um, estando no início do segundo triênio do segundo decênio, vivenciamos a cada dia, a confirmação da teoria de Karl Max: “tudo que é sólido se desmancha no ar”.
Tudo o que hoje é, pode não o ser amanhã.
As instituições, a família, os relacionamentos, nada mais é como no passado. Há um total desarranjo e grande desestabilização do que antes era tido como sólido e sagrado, mudanças de conceitos e de
paradigmas. Nada mais é definitivo, tudo é relativo, é um “pode ser, quem sabe?”.
Casamentos já não são somente entre pessoas de sexos opostos, homens não são necessariamente homens,
mulheres não são necessariamente mulheres, o que às vezes nos parece real, pode ser virtual e por aí a fora.
A constatação mais recente e comprovadora dessa volatilidade reside no episódio da renúncia do Papa Bento XVI - Joseph Ratzinger, que quebrou um tabu de aproximados setecentos anos, sem registro desta
natureza na Igreja Católica. O Papa renunciou ao seu mandato, deixando a todos perplexos e abrindo precedente sem igual nos últimos sete séculos. Esta renúncia fez ruir dois milênios de autoritarismo e rigidez do catolicismo.
Embora haja registros de renúncias anteriores, elas não exercem quaisquer influências sobre nós, visto que nenhum de nós e nem os nossos ancestrais recentes: pais, avôs, bisavôs, tataravôs etc., tiveram a oportunidade de vivenciar algo tão inusitado.
Essa abdicação aconteceu numa época em que muitas das mazelas do catolicismo têm ocupado espaço nos jornais e noticiários diários. Segredos guardados a sete chaves no Vaticano são revelados, mesmo que de forma bem incipiente, mas revestidos de magnitude tal que deixou vulneráveis séculos e séculos de desmandos, inquisições, ocultação de fatos degradantes da instituição e tantas outras fragilidades.
Se já era premente um repensar da Igreja Católica, com o advento dessa inesperada postura do Sumo Pontífice, tantas outras reflexões e mudanças de atitudes e valores terão que ocupar as pautas de ações do Vaticano.
Questões sobre aborto, virgindade, uso de preservativos, homossexualidade, voto de castidade, desvios de conduta e corrupção, pedofilia e tantas outras, terão que ser tratadas e colocadas abertamente para a população católica e também de outras religiões.
A Igreja Católica já não é mais intocável. Terá que aprender a dividir, a barganhar, a se curvar perante a realidade e se aproximar dos seus fiéis, abrindo-se à nova realidade mundial.
Com o precedente criado por Bento XVI, a cadeira do Papa não mais ficará vazia apenas com a morte de seu ocupante e a figura deste não será mais vista como intocável, inamovível e eterna.
As autoridades católicas terão que iniciar um período de flexibilização, de aproximação e de retenção de seus fiéis e se movimentar no sentido de arrebanhar novos seguidores.
O Vaticano, por intermédio do Colégio de Cardeais, tem agora uma ótima oportunidade para iniciar um novo período de mudanças, a começar pela escolha do novo Decano de nacionalidade não-européia.
Escrito em 1 de março de 2013.