PÂNICO NA MATA
SOS – PÂNICO NA MATA
Aquele velho coruja sabia realmente das coisas. Lembrava-se bem que aquele terreno era bem grande, com diversas árvores distribuídas pela área – grandes PAINEIRAS, que em épocas de reprodução, enfeitavam-se com lindos flocos brancos, que mais pareciam enfeites de Natal, que se desprendiam ao vento, espalhando nuvens de partículas brancas, lembrando a neve caindo e cobrindo as adjacências, QUARESMEIRAS, que davam o ar de sua graça, anualmente, com suas graciosas flores roxas, logo após o Carnaval e adentrando pelo período da Quaresma, JACARÉS, árvores espinhentas, cujos troncos rugosos e galhos do mesmo modo espinhento, que em idade adulta soltam ao vento suas sementes em vagens secas que são levadas longe, em cada lufada, juntamente com suas pequenas folhas.
Além disso, naquele terreno, existe uma grande piscina há muito abandonada, que resiste com um pouquinho de água de chuva, onde se criam larvas e mosquitinhos, além do mato alto que se esparrama por entre as árvores.
Pois é, matutava o velho coruja, empoleirado sobre um toco de paineira que sobrara da tragédia:
- “o antigo dono do terreno até que tentara tirar algum proveito de sua propriedade, alugando-o para eventos dominicais, mas... resolvera então especular e aguardou vantajosa oferta de uma empreiteira de obras, que vislumbrou ali, grandes negócios. Fez-se a transação e a empresa, sem qualquer vínculo com a comunidade e vizinhança, logo tratou de “limpar o terreno”, derrubando todas as árvores nativas que havia lá, vetustas paineiras, quaresmeiras e jacarés, todas pejadas de ninhos de pássaros, com ninhadas e ovos quase eclodindo e outros insetos e pequenos animais, como sapos, rãs, gambás, foram todos “despejados” sem prévio aviso, quando após a derrubada, os funcionários da empreiteira botaram fogo em tudo.
Foi um “Deus-nos-acuda”, com sabiás, rolinhas, Joões-de-barro, sanhaços, canários-da-terra, pardais e companheiros, em revoada fugindo do calor das chamas. Alguns pequenos animais e filhotes de pássaros que caíram dos ninhos torraram na imensa fogueira que se formou no terreno. O perigo foi tamanho que os vizinhos tiveram que chamar os bombeiros, temerosos de que seus imóveis fossem atingidos pelo fogo, fora o grande mau cheiro que exalava do incêndio.
Enfim, vaticinava o “símbolo da sabedoria”, naquela tarde, observando o terreno “limpo”, com diversos tocos de árvores à mostra, como testemunhas daquele “crime ambiental” e a piscina, que teimava em abrigar um resto de água, onde larvas de mosquitos continuavam a se apresentar no seu eterno “estica-encolhe”:
- Dinheiro compra tudo e ninguém mais se preocupa com o bem estar da natureza, que gera o bem estar dos homens. Mais um prédio será levantado ali, com 84 novos apartamentos de 32 m2 de área, cada um, gerando grande lucro para a empresa...
Um casal de maritacas que naquele momento sobrevoava o local gritou lá de cima: “para de se lamentar, Mané, imbecíl, é o progresso que chega... muitas pessoas mais terão moradia nesse lugar tão bucólico, terão mais qualidade de vida e tanto você, velho coruja e seus amigos bem-te-vis, sabiás, sanhaços, joões-de-barro, rolinhas, pardais, tico-ticos, façam como nós, voem para mais longe, afinal, logo ali tem mais uma mata, com árvores e ambientes propícios para todos.
O ancião coruja, com a voz embargada, tentou ainda argumentar: - Mas, até quando, os pássaros, insetos e outros pequenos animais terão que fugir? Logo, logo, a ganância dos homens os alcançarão e tudo vai começar de novo. Tristeza, ...e os Órgãos fiscalizadores da Prefeitura seriam coniventes com isso tudo? Aqui pertinho, passa o córrego e tem duas minas d’água. Como poderão autorizar a obra? Mais cimentação de terreno, mais asfaltamento de áreas, mais casas e prédios sendo construídos, impermeabilizando o solo... depois os homens se queixam de falta de água e baixa de nível das represas, apesar da lógica dos acontecimentos causados pelos próprios homens.
Um canário-da-terra, amarelinho e com topete avermelhado, pousou ali perto e falou para o coruja: - “Sabe, mestre, que ouvi um morador da rua ali perto, cantando aquela musiquinha que fez sucesso há tempos, que é mais ou menos assim: - E aí, vizinho, o que vai fazer? – Vou comprar uma CANCELA pra me defender”... “É, pensam em fechar a rua com uma cancela, na tentativa de conter a invasão de veículos na pequena rua deles, visto que a empreiteira apregoa 84 apartamentos, mas, somente disponibilizando 44 vagas de garagens...”
O tico-tico, falou então para o João-de-barro (tico-tico que anda com João-de-barro se torna Servente de pedreiro): -
“É patrão, vamos ter que construir as casas em outro lugar, nossas casas foram queimadas e destruídas pelos homens da empreiteira, me lembra até aquela música dos “Demônios da Garoa”, SAUDOSA MALOCA: “Cada táuba que caia, doía no coração”... agora, somente nos resta ir lá na piscina, de vez em quando, tentar bicar alguma larva de mosquito da dengue ou se der sorte um da “chikungunia”, isto até que acabem de vez nosso lanchinho, com a destruição dela...
FIM???