ACONTECEU COM JOÃO

No dia 11 de novembro de 2014, antes do vencimento das contas de energia e água, João decidiu pagar essas dívidas. Preferiu ir a pé até os locais de pagamento, pois é necessário movimentar o corpo; isso faz bem à saúde. Tudo deve estar em movimento. O jovem deixou, pois, a sua moto (transporte de pobre, ele é pobre) em casa. Ao voltar, já perto de casa, uma carreta parou no acostamento; o motorista buzinou. João, atento, olhou para a cabine e viu que o motorista lhe acenava; pedia a sua atenção. João parou e esperou que o motorista falasse. O caminhoneiro perguntou: “Aquilo lá é milho?” O homem simples respondeu: “É”. O desconhecido disse: “Vai comprar um milho pra mim!” Com um sorriso sarcástico, João afirmou: “É você quem deve ir”. O caminhoneiro insistiu. João, porém, não conseguiu se conter e soltou uma gargalhada, com todos os seus dentes e os dois dentões superiores. Acho que a sua gargalhada foi parecida com a gargalhada do seu velho pai. O pai de João era um homem sério, mas era possuidor de um dom incomparável para gargalhar. Era um homem sorridente, apesar de ser sério. João continuou a sua volta para casa. Ele ainda ouviu do motorista: “Tu não faz favor pra ninguém?” O homem simples, João, fez de conta que não ouviu mais nada e seguiu de volta pra casa.

Eu, autor deste conto – será que é mesmo um conto? – pergunto: se fosse alguém usando paletó e gravata, o motorista apresentado neste conto pediria esse favor? Se fosse um homem de aspecto bem forte (até que João está gordinho), com uma bela aparência (segundo os padrões sociais), esse caminhoneiro teria pedido esse favor? É claro que não! João andava de bermuda, camisa simples, calçado simples, mesmo estando muito limpo. Um detalhe: João tem a pele preta; nem tanto, mas tem.

O motorista mostrou sentimento de superioridade. É normal pedir favor. É bom pedir e fazer favor. Todos somos humanos. Será? Tenho as minhas dúvidas sobre o fato de sermos todos humanos. Entrementes, o que nos faz pedir um favor desses a quem não conhecemos? Ora, o local do milho ficava a uns 70 ou 100 metros de distância do caminhoneiro. Por que ele queria ficar esperando, na cabine, que aquele homem simples fosse comprar milho para ele? Com que direito? A escravidão acabou. Será? São tantas as dúvidas...

A nossa sociedade é feita de aparências. As pessoas são julgadas pelas aparências. O ser humano não é respeitado. Olha-se para a máscara, para a casca das pessoas.

É muito bom assumir uma atitude humilde: reconhecer-se pequeno, pó, mas reconhecer-se também importante; nem inferior nem superior a ninguém. Quem assume uma atitude superior poderá levar um grande choque.

João gosta de ser simples. Ele procura ser simples, “manso e humilde de coração”. Todavia, a simplicidade e a humildade têm um preço muito alto. Há pessoas que não querem tolerar a simplicidade. Ser humilde, porém, não é ser subserviente, submisso.

André Comte-Sponville, no seu “Dicionário Filosófico” (2003), registra: “Não se deve confundir, portanto, humildade com ódio a si, ainda menos com servilismo e baixeza. O homem humilde não se crê inferior aos outros: ele deixou de se crer superior. Não ignora o que vale, ou pode valer: recusa-se a contentar-se com esse valor”.

João diz não reconhecer nenhum homem superior ou inferior a ele neste mundo. João não se curva diante de ninguém, nem quer que ninguém se curve diante dele. João afirma que poderá até se curvar diante de alguém, se for diante de uma pessoa que tenha provado ser digna de sua admiração e do seu respeito. Neste caso, ele se curvará em sinal de reconhecimento da humanidade de alguém, e não para se considerar inferior. Nenhum ser humano é inferior ou superior a outro ser humano.

João vai vivendo baseado em valores e preceitos éticos. Não é um moralista nem quer sê-lo. Não é um homem rígido. Ele não é melhor do que ninguém. É por isso que ele não aceita ser inferiorizado. Muita gente, porém, continua se enganando; continua acreditando nas aparências. Todavia, é importante conhecer as pessoas, para não as julgarmos pelas aparências. As aparências enganam. As aparências surpreendem.

Você deseja conhecer o mundo? Assuma, por uns dias, apenas por uns dias, uma atitude simples e humilde! Ande limpo, mas ande simples! Faça-se de tolo! Finja que é um tolo! Você vai ver o que é o mundo.

João afirma que “o conhecimento verdadeiro, alicerçado na fé inabalável em Deus, tem o poder de nos fortalecer para os desafios deste mundo”. Eu concordo com João.

Deixo um pensamento de João: “Quem se considera superior a alguém tem a obrigação de provar a própria superioridade. Quem se considera superior está correndo o risco de mostrar a todos – mesmo sem querer – que não é o que imagina ser”.

Obs.: Fique atento a alguns casos ocorridos com João. Eu contarei alguns fatos da vida dele. Se você não leu, leia o texto (o conto – será mesmo um conto?) SEU NOME É JOÃO, do dia 11/12/2014. Em breve, teremos O MICROFONE E JOÃO, uma história de dez anos atrás.

Domingos Ivan Barbosa
Enviado por Domingos Ivan Barbosa em 12/12/2014
Código do texto: T5067099
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