OS PERIQUITOS ESTÃO LIVRES DOS GRILHÕES DAS TELAS
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Livres dos grilhões da ditadura que os aprisionavam e os impediam de comer mangas e dormir tranquilos nas palmeiras imperais que enfeitam à entrada do Condomínio Efigênio Sales, os periquitos asa branca agora cantam, voam e estão nas livres, sem preocupação de terem seus irmãos novamente mortos, por reivindicar seus antigos espaços. O local do Condomínio Efigênio Sales, onde foram erguidas mansões de luxo que abrigam empresários, desembargadores, juízes, procuradores do Ministério Público era no passado uma grande área verde de floresta nativa primária, pertencente a um empresário de automóveis, adquirida, loteado e realizada a infraestrutura de saneamento, com água de poço artesiano e iluminação pública pelo empresário Otávio Haman, que o venceu em lotes depois.
A floresta onde viviam os periquitos foi substituída por casas, ruas, clube e outras benfeitorias, nada mais lembrando do fora um imenso terreno cheio de árvores com uma casinha de fundo. O mesmo tipo de floresta primária, com pássaros, animais e uma casa de caseiro ao centro, com caminhos em volta, é o hoje Condomínio Mundi, onde resido, que pertencia ao empresário Ancelmo Garcia. No terreno, hoje, onze torres de concreto ocuparam o lugar dos animais. Mas isso são detalhes que não serve de nada para os periquitos porque o poder do dinheiro é mais forte do que o poder da natureza e os de asa branca perderam seus espaços. Teimosos, ainda e cantam no final da tarde e voando em bandos de uma árvore a outra e eu os vendo pelo vidro da janela de minha cozinha. Um espetáculo que só a natureza livre pode proporcionar a um sonhador com o equilíbrio harmonioso entre o progresso e a natureza. Depois, seguem para comer mangas no meio da Avenida Efigênio Sales e dormir no alto das palmeiras.
Sem as telas, os periquitos agora voam com a certeza de que não serão mais aprisionados pelos grilhos do poder financeiro, como fora, no passado a ditadura que proibia a liberdade, mas disfarçada de democracia, com um bipartidarismo, com ideologias definidas e certezas que não se corrompiam., Agora, terão onde dormir tranquilos, não precisando mais se preocupar com a morte de seus irmãos que tombaram na luta entre a força do capital e a fragilidade da natureza. Contudo, nunca mais terão de volta seus espaços porque o poder do dinheiro sempre falou mais alto do que o canto estridente dos periquitos que incomodavam os ouvidos sensíveis dos moradores. Uma ordem do IPPAM – Instituto de Proteção ao Meio Ambiente foi cumprida e as telas sob as palmeiras imperiais foram todas retiradas, pelo Corpo de Bombeiros, mais uma vez. Há versões desencontradas sobre o que realmente ocorreu para que ocorresse tanta morte de periquitos de uma só vez: as câmeras do Mundi mostram uma pessoa sacudindo os grossos troncos das mangueiras para derrubar e vender os periquitos que dormiam o sono dos justos. Contudo, a tese mais forte é de que teriam sido envenenados, mas isso quem vai revelar são os exames toxicológicos que serão feitas em duas universidades, uma em Minas e outra em Pernambuco, para onde vísceras e pedaços das telas já seguiram.
“Se for comprovado envenenamento, o Condomínio será multado em até 5 mil reais”, disse um membro do IPAAM, mas não disse se haverá enquadramento por crime ambiental. Se ocorreu colocação de veneno nas telas, existiu um crime. Se os periquitos asa branca morreram em consequência de veneno, o Síndico deve ser responsabilizado pelo crime ambiental, além da multa que o Condomínio receberá para ser pago por todos os moradores.
Os humanos estão invadindo o habitat dos pássaros e agora os voantes querem recuperá-los. Dificilmente e é quase impossível que consigam porque o poder do dinheiro sempre falou mais auto com relação poder econômico e a natureza. As telas sobre as palmeiras haviam sido retiradas uma vez por ordem da justiça, mas voltaram e permaneceram por quase dois anos no mesmo local, cobrindo-as. Elas começaram também a se sentir sufocadas e estão com folhas amareladas e poderão morrer igual como morreram os periquitos asa branca: com o próprio veneno da intolerância dos poderosos, a ganância do dinheiro e os ouvidos sensíveis dos moradores! Eu adoro ouvi-los e vê-los revoando de um lado para o outro como se fosse um balé mágico da natureza, que vejo todas as tardes, sem pagar nada por isso!
Ah, como me lembra a infância pobre na comunidade do Varre-Vento, quando corria com calção de saco de açúcar no corpo, com um estilingue no pescoço no meio do mato, procurando um passarinho para abatê-lo! Mas eu era tão ruim de mira que nunca acertei em nenhum e, quando consegui, era um anum e meu estilingue quebrou e nunca mais voltei a usar outro, embora fosse uma cultura na comunidade. Dizem quem bala um anum terá azar para o resto da vida.
Será que meu empiema cerebral em 2006 e as onze cirurgias no cérebro depois, teria sido resultado desse azar? Não acredito em azar; acredito, sim, que possa existir uma convivência pacifica entre o progresso e a natureza! Ah, como eu acredito!