O ANUNCIADO GOZO
A solidão presencial te traz de repente: aquilo que se deseja assim, quentinho e urgente. Então, numa torrente imaginária, a Poesia te arranca ao frio e à chuva. Paixão. É bom sentir o teu inspirar, desejosa de afeto e do poético em sua inusitada concretude. Estarei certo? Gostei da imagem, deste jeito que cativa desde quando chegas, e o espaço pequeno da janela virtual se ilumina. Nem sei como confidenciar o imagético, que flui sem timidez. Sim, em busca do Belo e das paixões que justificam o viver. Porque o resto é desimportante, se pressinto o objeto prazeroso. E o tenho como possessão, na sempre vontade de abraçar o vento. O teu ardiloso jeito de cuidar das palavras, assim como quando alisas os teus cabelos ao espelho. Os olhos a cuidar do todo refletido. Gosto da mulher que te habita sem pejos de entrega. O alter ego pronunciado capaz de aflorar o poema. E nem sei mesmo por que me aguça o sensitivo. Bobagens para um sábado como os de Vinicius de Moraes? Sim, eu te queria inteira, talvez sem roupas, só para ativar a luxúria que também me faz homem e carente de corpo. Sábado, véspera de domingueira, espaços circunstanciais para avivar pensamentos e calar estranhamentos de fontes do corpo. Sem silhuetas, ao menos para segurar a mão avara, com garatujas possessas que não sabem o que dizem ou fazem.
Vês? Talvez por conhecer a imagem da mulher que segreda ao ouvido, as letras saem agarradinhas umas às outras. E isto é incomum, mesmo que pareça tão oportuno, por apenas virtual, mas é verdade: semente para a libertação do que vive magicamente dentro de mim. É sempre assim: o amor fala pelos poros e um dos polos, especialmente à mulher madura, que deseja alguém para o aconchego do vinho e dos lençóis, no tímido sol que escorre na vidraça e no coração choroso de lembranças nunca apagadas.
A entrega é apenas uma destas contingências de disposição para o viver motivadamente. Sexo é uma consequência de estar bem ou mal disposto, mas sempre sedenta de recriação do possível prazer. Não estás dentro do ato, mas o amado, em princípio, está dentro de ti. Sim, o que prende a gente é o gostar do corpo, seus mistérios de fogo, mesmo que a cabeça não aconselhe. Parece-me que não há como manter algo sem este fogo: aquele mesmo de que Camões plasmou em “amor é fogo que arde sem se ver”, faz mais de quinhentos anos.
E o que fazer para além dos poemas que nascem antes de chegar ao gesto gráfico? O que aportará aos dedos está antecipadamente em mim: a sombra amorfa. Chegaste bem quando a ausência ansiava os seus estragos.
– Do livro POESIA DE ALCOVA, 2014.
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