Pretérito
Houve um tempo em que parecia, finalmente, nos termos acertado. Crescemos, envelhecemos, nos acostumamos com a voz da razão. Não havia mais amor, mais carinho, mais afeto, tampouco beijinho entregue de repente (que saudade da ambiguidade!). Nenhuma discussão, desentendimento, ou qualquer outro ‘d’. A falta, a qual antes era um incômodo, hoje é preenchida por planos ou pessoas. Ambas as partes já não sentem a necessidade de buscar quaisquer tipos de comunicação.
Houve um tempo que nosso maior medo era perder o amor que juntos construímos. Nossa maior prioridade era o ciúme exagerado – e, de certa forma, confortador.
Houve um tempo que nosso maior entendimento era sua música favorita da minha banda favorita. Houve um tempo em que minha preocupação era o fato de você não gostar de entrelaçar seus dedos aos meus; em contrapartida, seu gesto mais simples e lindo eram suas mãos em meu cabelo – uma metáfora da reciprocidade.
Houve um tempo que nossos lábios traduziam tudo aquilo cujas palavras já não podiam ser exprimidas. Houve um tempo que o silêncio que era instalado em nós era quebrado com a sua risada mais gostosa; esse mesmo silêncio era motivo para ficarmos nos olhando durante alguns instantes, os quais pareciam mais a eternidade.
Ironicamente, esse mesmo silêncio que presenciou momentos tão intensos, foi aquele que outrora serviu de hiato para os meses que se seguiram depois do seu adeus para mim. Esse mesmo silêncio estava lá, quando você não, e precisava desesperadamente da sua companhia física, quando a maior conquista seria receber um “eu te amo” no fim do dia – e um “bom dia” logo no começo.
Houve um tempo que felicidade resumia-se em existir um pouco de mim dentro de você, o qual era alimentado pela sua parte mais bonita e sensível, e que se tornou uma inefabilidade.
Todo esse pretérito imperfeito, feito da nossa pluralidade tão singular e que no presente já não se encontra mais (aquilo que um dia foi nosso estranho amor); em seu lugar, mora mágoas e ressentimentos. Agora, somos estranhos na vida que julgávamos entendê-la, deixando-a, portanto, para trás.