Pés e chinelos
Por que não é permitido aos homens ir ao trabalho de chinelo? – joguei a pergunta no ar. E não tanto porque desejasse andar de havaianas em horário comercial, mas por simples curiosidade mesmo. Tenho visto muitas mulheres irem trabalhar dessa maneira e me ocorreu que isso nunca acontecia com os homens – ao contrário, eles estão sempre com os pés bem escondidos. Joguei então a pergunta no ar: por que não é permitido aos homens ir ao trabalho de chinelo?
“Porque é feio”, responderam – um homem, evidentemente. De fato, o pé, e sobretudo o pé de um homem, não é exatamente o tipo de coisa que me agrada olhar, e se me pedissem para escolher quais pés devem ser exibidos durante o expediente, é bastante provável que eu votasse nos pés femininos mesmo. Outra opinião – a de uma mulher – foi a de que eu devia fazer por merecer exibir os meus pezinhos por aí. Porque, segundo ela, não é apenas vestir um chinelinho e pronto: antes, é preciso sacrificar alguns sábados cuidando deles. Há um preço a ser pago – e eu, na minha ingenuidade, acreditava que bastava ao chinelo ser mais confortável que o sapato.
Agora já me parece claro que apenas o pé bonito tem direito de ser mostrado. Mas as pessoas estão partindo da premissa de que meus pés são naturalmente feios. E, ao que me consta, ninguém até hoje se deteve sobre eles para avaliar se estão mesmo fora de qualquer padrão de beleza. É até possível que os meus pés sejam lindíssimos e eu não esteja sabendo, já que não é dado aos outros a oportunidade de contemplá-los. Se os visse, era até capaz do José de Alencar fazer uma nova versão para “A pata da gazela” – há de tudo neste mundo. Jamais saberei, condenado que estou a suportar os intermináveis verões de Brasília em calçados pouco confortáveis.
O chinelo é mais uma das boas invenções que sacrificamos para resguardar a nossa aparência – ou, o que é pior, a aparência de uma empresa. Bem aventurados são os apresentadores de telejornais, que nunca são vistos da cintura para baixo.