Barulho infernal
Um senhor bem vestido, que prefere barbearia a “salão de beleza”, falava alto, para quem quisesse ouvir: “Não vou mais à festa de formatura ou de casamento. É um barulho infernal! Para escutar ou ser escutado, encosto a cara na boca de quem me fala e sempre pego gripe ou ganho garganta inflamada. Além do mais, saio daquele barulho infernal, com os ouvidos zunindo”.
Fiquei pensando sobre o porquê do infernal, nunca achei barulho no Inferno, da “La Divina Commedia”, de Dante, nem essa atroz pena ou tal cruel castigo infernal no Purgatório. Imagine, se não por lá, tampouco no Paraíso. Na realidade, esse tipo de inferno é em vida, por aqui mesmo, são exibidores da potência do som, querendo ser os únicos escutados, não permitindo alguma conversinha que nos distraia das suas “habilidades musicais”, o que seria agradável se não fosse tão desconfortável e perturbadora zoada. Não há dono de festa que controle; a banda impõe o som naquele esmagador volume, não tolerando fofoca, piada ou conversa séria... Se alguém encurralasse naquele ambiente ensurdecedor um rebanho de bois e vacas ou de ovelhas e carneiros, debandariam, lá não ficaria um só bicho. Assim orienta a sábia natureza e faz com que as mesas mais distantes do palco sejam as mais procuradas, longe, como diz Graciliano Ramos, do “batecum” insuportável. Até os surdos reclamam: “Música alta! Pensam que sou mouco”...
O irônico: Nas ruas, tal barulho é proibido, desde que se chame a Sudema com seus decibelímetros para medir os decibéis dentro ou fora do limite consentido. Mas, nessas festas familiares ou escolares, o além do máximo é permitido; os convidados, trancados num ambiente fechado como no jantar de Luís Buñuel, em O Anjo Exterminador, entregam-se a discreto masoquismo. Nessas festas de núpcias, teme-se até que o som rompa nossos tímpanos... Enfim, os tocadores param seus instrumentos para uma pausa, o silêncio nos reconforta, convencendo-nos como realmente o barulho estava infernal. Mas depois, “La nave va”, e, em atenção aos pais dos nubentes, atinge-se a hora justificável da saída, quando já é madrugada. Chegando em casa, às duas da manhã, ainda sem “lesão coclear”, a audição serena , volta ao normal, introduzindo-nos no silêncio para um bom sono. Conclui-se, então, que o conforto seria apenas a diminuição daquela barulheira prevista para as próximas formaturas, para os próximos casamentos. Porque, somente nessas ocasiões, acontece solenemente tamanho barulho.
Fiquei pensando sobre o porquê do infernal, nunca achei barulho no Inferno, da “La Divina Commedia”, de Dante, nem essa atroz pena ou tal cruel castigo infernal no Purgatório. Imagine, se não por lá, tampouco no Paraíso. Na realidade, esse tipo de inferno é em vida, por aqui mesmo, são exibidores da potência do som, querendo ser os únicos escutados, não permitindo alguma conversinha que nos distraia das suas “habilidades musicais”, o que seria agradável se não fosse tão desconfortável e perturbadora zoada. Não há dono de festa que controle; a banda impõe o som naquele esmagador volume, não tolerando fofoca, piada ou conversa séria... Se alguém encurralasse naquele ambiente ensurdecedor um rebanho de bois e vacas ou de ovelhas e carneiros, debandariam, lá não ficaria um só bicho. Assim orienta a sábia natureza e faz com que as mesas mais distantes do palco sejam as mais procuradas, longe, como diz Graciliano Ramos, do “batecum” insuportável. Até os surdos reclamam: “Música alta! Pensam que sou mouco”...
O irônico: Nas ruas, tal barulho é proibido, desde que se chame a Sudema com seus decibelímetros para medir os decibéis dentro ou fora do limite consentido. Mas, nessas festas familiares ou escolares, o além do máximo é permitido; os convidados, trancados num ambiente fechado como no jantar de Luís Buñuel, em O Anjo Exterminador, entregam-se a discreto masoquismo. Nessas festas de núpcias, teme-se até que o som rompa nossos tímpanos... Enfim, os tocadores param seus instrumentos para uma pausa, o silêncio nos reconforta, convencendo-nos como realmente o barulho estava infernal. Mas depois, “La nave va”, e, em atenção aos pais dos nubentes, atinge-se a hora justificável da saída, quando já é madrugada. Chegando em casa, às duas da manhã, ainda sem “lesão coclear”, a audição serena , volta ao normal, introduzindo-nos no silêncio para um bom sono. Conclui-se, então, que o conforto seria apenas a diminuição daquela barulheira prevista para as próximas formaturas, para os próximos casamentos. Porque, somente nessas ocasiões, acontece solenemente tamanho barulho.