O TRÂNSITO

De uns dias para cá, políticos do governo, noticiários da mídia e pronunciamentos de pessoas conhecidas, nas rodas da economia, tem se manifestado com loas e boas às medidas governamentais que estão acabando com a miséria no país levando, para a classe média, toda aquela gente inserida nos bolsões da miséria e todos se fartando com as três refeições diárias do Programa Fome Zero.

Junte-se a isso as providências no que concerne ao Fisco, bem como as facilidades para a contratação de empréstimos bancários e, principalmente, a redução do IPI que transformou todos esses nossos heróis em uma nova massa motorizada.

Sim! Isso é verdade, pois os bancos, abrindo as comportas para os ex-miseráveis permitiram que, se não todo mundo, pelo menos quase todo mundo pudesse comprar o tão sonhado carro próprio, mesmo à custa de um endividamento maluco, por sessenta meses adiante.

O resultado disso pude perceber, hoje, quando saí para comprar uns remédios, de uso continuado, numa farmácia próxima do local onde vivo.

Eram aproximadamente umas três e meia da tarde e ninguém podia ver o azul do céu. Desde a madrugada, uma nuvem cinzenta e pesada se abateu sobre a cidade e ficou, renitente, por todo o dia, impedindo que o Sol viesse cumprir o seu papel na manutenção da vida planetária.

O vento sem moral não tinha expressão para empurrar a tal nuvem e até desistiu. Deu um muxoxo e foi soprar lá para as bandas do Sul. Entretanto, com raiva, deixou uma nesga de frio que dava para aborrecer as pessoas e enfiá-las em casacos de tecido grosso.

Saí a pé e fui caminhando em busca do meu objetivo. Todavia, não podia deixar de observar o panorama que se desenrolava. O trânsito estava, praticamente, parado! O pagamento que começava a ser liberado atraia, para os bancos e comércio, multidões de pessoas, todas ávidas de correrem para supermercados, lojas ou outras áreas em que cuidariam de cumprir com seus compromissos financeiros.

Sobradinho, cidade do entorno de Brasília, pelo recenseamento de 2011 está pela marca dos 105.363 habitantes e é a quarta cidade com o maior índice de renda do Distrito Federal. Ao que parece, boa parte das pessoas conseguiram adquirir o seu carro particular e isso é atestado pela confusão diária que já podemos constatar, sobretudo nas ruas e adjacências da Quadra Central, onde reina a maior concentração do comércio local.

Assim, as pessoas que buscam fazer suas compras não hesitam em sair com seus carros fazendo questão de estacioná-los, senão dentro, pelo menos diante da porta da loja escolhida. Não sei se tratamos de puro comodismo, de falta de bom senso ou ignorância, mesmo. O fato é que isso provoca um congestionamento sem tamanho e as filas de veículos semi paralisados aumenta a cada dia...

O cheiro de monóxido de carbono invade nossas narinas e se refestela bem lá dentro dos pulmões, numa promessa vaga, de asfixia ou promessa de algum câncer oportunista. Pior, ainda, quando estamos respirando a descarga dos motores movidos a etanol, para gáudio da indústria sucro alcooleira do país.

Temos, então, automóveis estacionados nos locais permitidos e, principalmente, nos não permitidos. Vemos veículos em fila dupla, obstruindo os que estacionam dentro dos padrões. Automóveis ocupando vagas destinadas a idosos e deficientes, sem a afixação da devida autorização do DETRAN. Carros invadindo calçadas, recuos, terrenos baldios, na mão, na contramão, caminhões descarregando mercadoria, etc...

Indiferentes a toda essa confusão, nas ruas centrais da cidade, os famigerados “carros de som”, numa barulhada infernal, cuidam de atenazar a vida dos passantes, clientes, funcionários e comerciantes, anunciando essa ou aquela loja ou produto. Emoldurando o pregão, utilizam cortina musical de gosto um tanto ou quanto discutível caracterizando verdadeira agressão ao direito das pessoas viverem sem terem seus ouvidos explodindo, em razão da falta de bom senso de anunciantes ávidos de lucro e da total ausência de fiscalização ou policiamento de trânsito.

Para os transeuntes, a travessia das ruas e avenidas acaba por se transformar em uma aventura por terem que arriscar-se em meio a um fluxo desordenado de veículos, com motoristas irritados e travados, em dificuldades para estacionar ou para seguir seu caminho...

Dia desses, andando por conta de um auxílio ao coração e desgaste no colesterol, acabei por bisbilhotar os preços dos veículos postos à venda em algumas das agências de automóveis da cidade. Havia preços para todo o tipo de bolso com todas as benesses do facilitário.

Mais adiante, em uma ruazinha residencial, estacionado, havia um que chamou minha atenção. Era um “Escort-85” ostentando no pára-brisas a seguinte inscrição com tinta guache branca:

“VENDE-SE” – “DOIS MIL REAL EM DEZ PRESTAÇÃO”

Amelius
Enviado por Amelius em 05/11/2014
Reeditado em 05/11/2014
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