bem-me-quer

Consegui as mudas com um senhor, vizinho, japonês. Todos os dias passava à frente de sua casa e lá estava ele varrendo sua calçada. Arcado, imaginava, quanto não lhe custava aquela tarefa, mas lhe dava satisfação também: vida! Depois o encontrava no lago, passos lentos, arrastando sandálias, cansados, a caminhar com seu cachorro vira-lata.. Cumprimentava-o todos os dias. Nem sabia seu nome. Mas ele correspondia com um largo sorriso e eu partia feliz. Certa manhã de primavera, vi as margaridas de seu jardim, que lindas! Há quanto tempo não as via assim, tão ternas, tão belas. Não tive o menor constrangimento. Pedi mudas e , com toda boa vontade, mas com certa dificuldade, abaixou-se, arrancou-as e entregou-as para mim. Levei-as no mesmo dia para minha mãe. Ela colocou-as em uma bacia, até a chuva chegar. Depois, fizemos um canteiro à frente da casa e as plantamos. Ficamos meses à espera dos botões. Aquele seria o primeiro finados depois da morte de meu pai. A torcida era que elas florescessem nessa época. Chegou final de outubro, e elas estavam carregadas de botões. O adubo que utilizamos? o amor. No dia de todos os Santos, ela ligou feliz e me convidou para colher as margaridas. Fui ao final da tarde, para que não murchassem. Foi um ritual lindo, alegre, emocionante, e ao mesmo tempo triste. Colhemos uma a uma. No outro dia, levantamos cedo e fomos para o cemitério . Em cada túmulo,rezávamos uma ave-maria e depositávamos a flor em forma de nosso amor e saudade... já não tenho você nem o pai aqui para apreciar a beleza da margarida. A dor é tão imensa, chega a dilacerar por dentro a alma. Ficaram a beleza e o cheiro da ternura, do amor, do zelo de vocês para comigo. Sigo colhendo margaridas ... pra vocês!

Bemtevi
Enviado por Bemtevi em 03/11/2014
Código do texto: T5021265
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