À INFÂNCIA, EM MEIO AO SOL DA MEIA- NOITE...

lUZES , POR FAVOR!

Véspera de eleições ao Planalto e frente às emoções nacionais insurgidas de desejos sociais legítimos, bem à flor da pele surge minha crônica, a mim chegada em meio às calçadas borbulhantes dum recente dia.

Não foi numa "calçada indigente", dessas cujo cenários a céu aberto desnudam a intimidade das crescentes vidas abandonadas ao léu, sob um céu infernal que interessa às pontuações dos discursos e aos votos urgentes e ingênuos pela vida digna, pela dignidade de direito natural, a que começa na atenção responsável do Estado com a infância de "todas as classes" a desenhar no presente imediato a ânsia dos atos aos teatros do futuro promisor.

Minha crônica surgiu, então, numa calçada social de punitiva classe média, à luz do sol duma manhã recém encenada, mediana social pela qual peço desculpas pelos pecados de a ela ainda pertencer, pagando todas as penitências cabíveis com primor cidadão, posto ser árdua a luta pela sobrevivência classista dentre tantas fomentações de ódios e discórdias por parte de quem deveria unir e apaziguar as tensões nas ruas, cenário da luta difícil pela vida de qualquer classe social trabalhadora da nossa triste e violenta atualidade.

Foram as paredes grafitadas da calçada, onde a arte de rua se comunica com os transeuntes fazendo poesia paradoxalmente cáustica e singela, que um verso, escrito em tinta preta e forte, algo já derretido pelo calor da estiagem urbana, me chamou a atenção profundamente.

Não saberia lhes dizer se o verso que li ali pertence a algum poeta da antologia clássica ou moderna, estou a pesquisar, todavia, ali lançado na parede caiada do dia que nascia, ganhou força metafórica, dentre nuanças da vida da infância tão dura e abandonada pelo nosso país, encenada cada vez mais surrealmente nos entremeios dos arranhacéus crescentes e desprovidos de consciência ecológica e humanística, num espaço castigado entre semáforos vermelhos para tantas vidas que se iniciam e cada vez mais amarelos para a sociedade agonizante, flagelada em tudo.

O verso curto que ali li em leitura dinâmica, em meio a passos rápidos para o que não saberia dizer, tangenciou minha retina, acionou meu olhar para o todo, me parou por uns segundos e ganhou o mundo dos meus sentimentos pré eleições, inclusive.

Que momento importante para a vida de todos...pensei.

O verso era forte, e ali claramente prefaciava a antologia humana das vergonhas escritas nas páginas crônicas e irresponsáveis da humanidade daqueles que garantem cuidar das vidas, dos que comandam a escrita de qualquer história de abandono com o que é sagrado, e cujas letras tênues e inexpressivas zombam do tempo e nele se dissipam em frutos perdidos em qualquer hora ou lugar.

Não há futuro social com a infância à escuridão das calçadas, ainda que o sol brilhe alto na aurora da vida que se recicla igualmente sob um céu que é legitimamente de todos.

Não há futuro promissor algum esboçado nos palanques aos ventos quando tanta infância perdida se revela nas ruas dos anbandonos sórdidos, a escrever versos que nos fazem arrepiar os sentidos já sem nítida direção.

Não há futuro promissor com semeadura de ventos num terreno de luta de classes.

Terminei minha caminhada a pensar exatamente sobre o conteúdo desta minha crônica....porque tenho a convicção de que nenhuma caminhada pelas calçadas da vida segue muito a frente, diante de tanta escuridão social.

Quem acenderá nosso futuro, afinal?

Aquele tão tristemente protagonizado nos duros prefácios das vidas nas ruas?

Fechei os olhos e trouxe no coração o verso grafitado na parede da retina, em letras trêmulas, algo infantis, mas que nitida e cinicamente nos pediam por socorro, aquele que nunca nos chega:

"Em casa de menino de rua, o último a dormir apaga a lua".

(autor Giovani Baffô) )

Então em silêncio, como numa oração às bocas das santas urnas, assim me perguntei:

Quem, milagrosamente, nos acenderá o sol nesta "meia- noite" tão perene?