A NOITE EM QUE O BLUES NASCEU...

A NOITE EM QUE O BLUES NASCEU...

"...dinheiro, eu tenho muito dinheiro! (...)

Aumenta que isso aí é Rock'n roll" !

CELSO BLUES BOY (trecho de 2

músicas dele, dos anos 80)

"Um dia na Vida / pode mudar seu Destino /

se o sonho de menino / se tornar pesadelo"!

'NATO" AZEVEDO (trecho de versão livre)

Se o leitor ocasional imagina que este texto irá tratar das raízes do Blues, de seu surgimento entre campos de algodão do Tennessee e junto às águas do rio Mississipi, pode "tirar seu cavalinho da chuva", diriam os mais antigos. Esta crônica trata de minha "iniciação" na vida artística, se é que tive alguma.

Fico curioso para decifrar em que momento eu me vislumbrei artista, eu me defini CANTOR, em que exato instante da existência finalmente reconheci que era aquilo mesmo que eu queria. A intuição de cada um o leva a procurar caminhos que o realizem, pessoas e locais que já lidam com o tipo de atividade artística pretendido. Foi assim comigo também! Talvez a delirante iniciativa de produzir um show de rock -- "embrião" anônimo do futuro "Rock in Rio" (veja-se a crônica "Eu 'inventei' o Rock in Rio", no site OVERMUNDO) -- era apenas pretexto para estar próximo de músicos e vocalistas, com os quais meu sonho maior "se identificava".

Os saudosos tempos no jornal BALCÃO, da família-maravilha do sr. Johnny Fletcher, foram o degrau principal para eu iniciar a procura de um caminho no reino da Música. A partir de anúncios gratuitos pude contactar perto de 15 Bandas de rock, das quais conheci e visitei umas 5 ou 6, participando de ensaios e "me analisando" na figura dos artistas admirados por mim.

Na Redação do Jornal, virando noites revisando, diagramando e "montando" os "layouts" das 20 ou 30 páginas -- que em pouco tempo transformaram-se em 60 ou 100 pags -- sob a supervisão tranquila do "coroa prafrentex" JÚLIO CÉSAR, exímio diagramador e arte-finalista, Pablo, Róbson e eu nos divertíamos trabalhando, toca-fitas "rodando" rock dia e noite. Meu tempo foi curto na Redação do BALCÃO, eu era agenciador de anúncios anteriormente, mas aprendi demais e as lições práticas sobre diagramação me servem até hoje. Com "Robinho" e Pablo assistimos ao avassalador KISS, fazendo tremer o Maracanã com salvas de um canhão. A arquibancada "balançava" igual gangorra, não achei a menor graça naquilo.

Adiante, fomos ao ensurdecedor show dos irmãos VAN HALEN, caixas acústicas imensas interligadas com "plugs" do tamanho de um abacate. Show inesquecível, bateria com aros de fogo e GUITARRAS SEM FIO, novidade absoluta na época, 1982, permitindo aos músicos percorrerem o palco todo, microfones com transmissor na cintura. Foram precisos MAIS DE 20 ANOS para o Brasil adotar técnica semelhante.

Não sei porquê, "na noite em que o Blues nasceu" eu estava sozinho, não me lembro de nenhum dos 2 amigos rockeiros ao meu lado, talvez porque moravam em Niterói e as Barcas de translado não funcionavam durante a noite. O show era "no pé do Morro" da Urca, uma espécie de varanda coberta que nem sequer parecia um bar, um local de shows com alguma classe. Tendo aprendido pontualidade na escola cheguei cedo, para meu castigo... o show só começou hora e meia depois da hora marcada, uns 20 jovens na platéia.

Eis que surge CELSO BLUES BOY, meu "xará", já que fui batizado assim, que meu pai dizia ser nome de pobre, me registrando com um sonoro CINCINATO. Conhecia a obra de Celso Blues Boy através de uma Rádio rockeira carioca, a Petrópolis FM, salvo engano. Como êle tocava gaita de boca em algumas músicas me interessei, pois "arranhava" o instrumento. Aliás, tive certeza de que queria mesmo aprendera tocar depois que vi no "Shopping" antigo da (rua) Siqueira Campos um certo Eduardo -- "Dudu" ou "Duda", com uns 15 anos -- tocando Bob Dylan em uma "gaitinha" de 5 cm e 4 "buracos" apenas. Comprei discos de "bluesmen", tive 3 ou 4 harmônicas ("horn", em inglês) e, como nunca aprendi a tocar com perfeição, hoje "imito" o som de gaita com minha voz.

Mas, dizia eu lá atrás... "eis que surge no palco Celso Blues Boy"! Todo de branco da cabeça aos pés, chapéu de palha "Panamá" e guitarra -- não vi a Banda, mas estava lá -- era uma figura impressionante, algo meio etéreo, celestial, luz magnética na escuridão total. Naquele momento algo me sussurrou que era aquilo que eu queria... CANTAR num palco, cantar rock e blues, cantar meus sonhos e pesadelos, cantar tristezas e alegrias. Foi uma noite inesquecível, que me trouxe a certeza de que Blues só serve AO VIVO, nada de CD ou disco LP, é preciso VER E SENTIR o som e a mensagem. Muita "água rolou" por debaixo da ponte após aquela noite, minha vida "virou de cabeça para baixo" diversas vezes, mas meu objetivo de cantar continua intacto, desejo firme que só recentemente consegui realizar de forma precária mas perceptível, enquanto o Destino não traz mais uma reviravolta à minha existência.

"Os sonhos não são sonhos / pra quem quer realizar. / São certeza e esperança / pra quem sabe sonhar"... declaro em "Sonhos Reais". O sonho atual é ter alguma música de minha autoria gravada por um popstar qualquer, primeiro degrau para se ser conhecido. Fora isso, meu desejo é continuar gravando as quase 50 músicas ainda inéditas, se ninguém atrapalhar. A Sorte é um "cavalo sem sela"...

"NATO" AZEVEDO (escritor e compositor) - 21/out. 2014