FÁBIO LUCENA, O BI SENADOR DO AMAZONAS
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- Sou o único bi senador pelo Amazonas, disse eufórico senador Fábio Lucena ,interrompendo momentaneamente uma reunião do grupo do governador Gilberto Mestrinho, sempre com sua voz grave e empostada, sua marca registrada. O “trovão” de Barcelos, denominação que recebera do senador João Calmon, teria dito Fábio Lucena (Pereira Bitencourt) renunciou a quatro anos de mandato e fora reeleito só para participar com legitimidade da Assembleia Nacional Constituinte. Em 82, Gilberto disputou contra o candidato Josué Filho. Fábio Lucena também se elegera senador no grupo político, derrotando o ex-governador do Estado, José Lindoso, para um mandato de oito anos, mas renunciou a quatro anos e venceu uma eleição para o senado para mais quatro anos. Dai a razão de ter se proclamado um “bi senador pelo Amazonas”.
A ANC foi instalada no Congresso Nacional oficialmente no dia 21 de fevereiro de 1987, com a finalidade de elaborar uma constituição democrática para o Brasil, após 21 anos vivendo sob regime militar. No dia 2 de setembro de 1988 foram encerrados todos os trabalhos e aprovado o texto final da nova Constituição, chamada pelo então presidente da Câmara, Ulisses Guimarães de “Constituição Cidadã”, acrescentando que agora se “cumpra o que está escrito”. As eleições para a constituinte originária foram convocadas pelo Governo José Sarney e realizadas em novembro de 1986, quando Fábio Lucena, o único bi senador do Amazonas., até os dias de hoje, se fez presente com autoridade, legitimado pelas urnas. Depois, todos cumpriram os finais de seus respectivos mandatos de 4 ou 8 anos, mas Fábio Lucena cometeu suicídio por depressão durante o decurso de mandato, após o falecimento de sua mãe Otília Pereira Bitencourt, a quem era muito ligado.
O senador “trovão”, designação que recebera do senador João Calmon, pela contundência e firmeza nas suas palavras e argumentações, fazia o Senado parar e, que, como fazia na Câmara Municipal, “igualmente se mobilizava para ouvi-lo e aparteá-lo com elogios ou contradizê-lo duramente”. Lá seguiu com discursos polêmicos, como o que pronunciou no dia 07/06/85, defendendo a renúncia ou redução dos mandatos de todos senadores eleitos, ou por decisão própria ou renúncia à quatro anos de mandatos para se submeterem a um referendum nas urnas e, posteriormente, participarem da Constituinte, que elaborou a nova Constituição do Brasil. Durante esse seu discurso, o senador Jorge Kalume, o teria chamado de um “jurista brilhante”, ao que, o senador Fábio Lucena lhe respondera que não o apoiava porque era apenas um “curioso jurídico”, conforme registra o excelente livro do “FÁBIO LUCENA, GRANDES VULTOS QUE HONRARAM O SENADO” (in Júlio Antônio Lopes, 2013). Todo esse discurso e vários outros, com os apartes dos senadores, está publicado na obra do escritor Júlio Antônio Lopes. Fábio renunciou e se reelegeu, razão de sua euforia na reunião para a composição do secretariado do governador Mestrinho.
Muitas verdades, elucubrações e inverdades e até algumas lendas foram criadas em torno dessa figura política ímpar na história. Como editor geral do Diário do Amazonas, em Manaus, em torno de 21 horas, recebia ligações do senador com vários pedidos. Sabendo tinha sido Assessor de Comunicação da Associação dos Exportadores da ZFM, presidida pelo vice-governador de Gilberto, Manoel Ribeiro, que não queria ser candidato, mas se tornou um líder político na área do Distrito Industrial e foi designado para presidir o então Banco do Estado do Amazonas, hoje Bradesco: “Carlos Costa, como você é amigo de Manoel Ribeiro, pede a ele para demitir o gerente do BEA aqui de Brasília porque eu fui lhe pedi um empréstimo e ele não quis me emprestar”.
Depois da eleição de Amazonino Mendes para governar o Amazonas, Fábio voltou a ligar para o Diário do Amazonas e pediu, quase ordenando: “Carlos Costa, escreve ai em tua coluna que não irei para a posse de Amazonino Mendes porque estarei porre em Brasília”. Nada publiquei, na coluna de notas curtas que eu escrevia. No dia seguinte em novo telefonema o senador me questionou: “Carlos Costa, li toda a sua coluna de opinião no Diário do Amazonas e não li a nota que lhe pedi que colocasse no seu Jornal”. Tentava argumentar com o senador, explicar-lhe porque não a tinha colocado porque não seria adequado para um senador da república, mas do outro lado da linha, com tom de voz alterado, me dizia: “não foi um pedido. Foi uma ordem mesmo! Eu fiquei porre em Brasília, no dia da posse de Amazonino Mendes, só para não comparecer”. O senador desligou e eu fiquei rindo sozinho por dentro pensado no estrago que a imagem dele poderia sofrer junto aos seus eleitores!
Esse era o lado curioso do senador, mas não oculto porque todos sabiam que ele bebia muito. Perdeu seus amigos intelectuais do “Bar Caldeira”, em Manaus, que bebiam com então vereador e ficou meio deslocado em Brasília, como senador. Depois que perdeu a mãe, passou a beber mais ainda, terminando por tirar a vida em um episódio que, 20 anos depois, ainda gera controvérsias e discussões. Mantive os telefonemas que recebia em segredo até agora, mas decidi revelar esse fato porque livro de Júlio Antônio Lopes aborda esse lado, irônico, determinado e cômico do maior, melhor, mais intelectualizado e completo senador que o Estado já teve em sua história mais recente!
Ex-funcionário do Jornal A NOTÍCIA, Fábio Lucena foi trabalhar no jornal A CRÍTICA, o que era considerado uma ofensa pessoal essa troca porque os dois jornais disputavam a preferência dos eleitores. O primeiro era muito sensacionalista com manchetes escandalosas criadas pela mente criativa do jornalista Bianor Garcia e os leitores diziam que “se espremesse sai sangue”. O outro, não adotava essa linha. Trabalhando no Jornal A NOTÍCIA, eu o admirava e lia todos os artigos escritos por Fábio Lucena, porque escrevia de forma limpa, com citações literais de livros sem consultá-los e fascinavam leitores e os seus eleitores, pela eloquência que empregava nas palavras e correções em seus textos.
Depois da eleição de Gilberto Mestrinho, em 82, a imprensa queria adivinhar quem seria o prefeito de Manaus, nomeado pelo governador Gilberto Mestrinho. Amazonino Mendes foi o indicado. Ele não era conhecido em Manaus por ser advogado e dono da empresa Arca Construções Civis e por ter algumas dificuldades empresariais, o que causou surpresa para a gente. Era um desconhecido em política. A imprensa especulava vários nomes, inclusive de ex-prefeitos que já tinham administrado a cidade, como o de Isper Abrahim Filho, que já tinha sido prefeito interino.
O excelente livro de cunho histórico e político de uma fase do Brasil recente, escrito por Júlio Antônio Lopes, diz que tanto como vereador em Manaus ou como senador em Brasília, os discursos inflamados de Fábio Lucena, eram contundentes e as pessoas paravam para ouvi-los, causando enormes repercussões na Capital. Certo ou não, o senador Fábio Lucena foi o único político do Amazonas que conseguia parar votações do senado até que seus pleitos fossem votados, aprovados ou recusados, sobretudo quando eram em favor da Zona Franca de Manaus. Arthur Neto, quando senador, também conseguia esse feito pelo poder da oratória que tinha, mas Fábio Lucena tinha também o poder da ironia felina e perspicaz, que Arthur Neto não tinha.