O CONVITE
Eu estava guardada em uma caixinha, uma caixinha de madeira leve, simples e que tinha uma porta. De repente o vento vem me chamando e abrindo vagarosamente a porta tão fina quanto aquela folha seca do outono e ah! tão frágil. O vento era sorrateiro e causava-me medo, um espanto, assim como a noiva escondida e espantada ao ver as frutas abertas, mas é claro! tudo que é novidade, vai causar-lhe sempre um teor minimo ou máximo de ansiedade. Apesar do medo, aceitei o convite que o vento me fez, de saltar daquela caixinha com ele. A única certeza que ele me dava é que eu iria experimentar uma palavra: Liberdade. Disse também que eu ia desbravar cada montanha e cada vale de cada letra desta palavra. Meu receio era tanto que não parava de olhar para trás e ver aquela minha caixinha, que dava-me o conforto necessário para viver o resto da minha vida sem um sonho, mas enquanto estava nela não conhecia a palavra sonho, viveria na solidão e sem realizar uma aventura sequer. Via na caixinha uma prisão, onde não me era permitido conhecer novas palavras. Foi então que este vento sorrateiro veio invadindo minhas células e toda aquela romaria se afastava para dar passagem a este vento, este ar em movimento. Ele era invasivo e a cada pensamento de que não podia sair com estranhos ele vinha e anulava todo esse tipo de pensamento e todo tipo de razão. Quando enfim saltei com o vento me senti como as águas de uma cachoeira silenciosa, com medo das quedas, mas o medo era no começo, onde não conhecia nada. Cheguei então em meu segundo estágio, dando voltas nas montanhas da primeira letra ''E'', onde fui me familiarizando com a sensibilidade, fui sentindo as cores azuis que refletiam nas águas cristais, as cores verdes repletas de energias e vida, presente em cada folha de florestas úmidas que estavam bem em frente destas águas cristais. Foi aí então que dei de frente com outra palavra: Amor. Fui percebendo que não conseguia regressar mais, pois me doei a esta palavra, que me molda em uma simplicidade tão grande que chega a ser sofisticada, se assemelha aos Gymnopédies, de Satie, notas que invadiram tão lentamente e tão simples e que conseguiram chegar no meu íntimo, (por isso tão sofisticada) e tudo era tão puro, parecia a bruma de uma manhã de inverno. Este continua sendo meu estágio até agora, estágio em que o vento abriu caminhos para um conhecimento íntimo de si, um convite para voar.