O Homem que Chora
 
Não sei cozinhar. Não sei andar a cavalo. Não sei cantar. Não sei dirigir automóvel. Não sei andar de moto. Mas sei chorar.(Parêntese necessário: neste ponto, alguém dirá: homem que é homem não chora. Ora, nasci fui criado no Vale do Rio Doce. Cresci ouvindo: homem que é homem não chora. Quanto conflito eu tive por isso! Tantas vezes chorei por um nada e por coisas sérias, que duvidei de minha condição masculina.Chorei porque caí do cavalo. Chorei quando entrei num trem de ferro e o apito avisou que eu ia partir. Chorei de saudade. Chorei porque vi minha mãe chorar. Chorei de amar. Chorei de tristeza. Chorei de solidão. Chorei quando perdi o primeiro amor e quando perdi o último amor. Chorei quando perdi entes queridos. Sou um especialista em prato: choro no cinema, chora vendo telenovela, choro lendo jornal. Sou um homem que chora),
   Também fico pensando que não faltará quem pergunte: Para que serve um homem que chora? Creio que o pranto tem muita serventia no mundo em que vivemos. Há razões para rir e cantar e dançar e festejar no mundo em que vivemos. Mas razões para chorar existem e não são poucas. Imagina, no entanto, que os leitores e leitoras, por certo, achariam melhor se eu escrevesse, depois das coisas que não sei fazer: Mas eu sei sorrir. (Segundo parêntese: sou um tímido, disfarçado, mas sou. E minha timidez maior é para sorrir. A mim me aborrecem os fotógrafos de jornais e revistas e os câmeras da televisão quando ordenam: Sorria, você está muito sério!
   Mas por que tenhoi que sorrir nas fotografias? Por que tenho que sorrir na televisão? Com a máquina na mão nossos queridos fotógrafos são ditadores. Eles dão ordens do tipo: sorria, suba um pouco o ombro esquerdo, vira a cabeça para a direita. Etc, etc, etc. E, diante dos fotógrafos, ficamos inseguros e indefesos. Imagino que, a qualquer hora, eles vão dizer: Faça um ar de Robet Redford! Sorria como Tom Cruise ! Faça um ar de Antônio Banderas ou de Antônio Fagundes. Oh, que saudade que eu tenho dos lambe-lambe de outrora quando cheguei a Belo Horizonte vindo do interior e era um rapaz puro e simples. Tão puro e tão simples que ia lá no Parque Municipal tirar retratos com os lambe-lambes. Eu era tão inocente, que acreditava, quando eles diziam: Olha o passarinho! Fecho o parêntese e prossigo).
   A maior humilhação de minha vida aconteceu quando, depois de morar em Araxá, voltei aos 8 anos de idade ao Vale do Rio Doce. Obrigaram-me a montar num cavalo. Obrigaram-me a ir a uma fazenda onde eu não queria ir. Uma tarde, em Sant`Ana dos Ferros, montei, como eu disse, obrigado, num cavalo, e ele entrou numa casa adentro comigo em cima. Eu sabia andar de bicicleta. Sabia sandar de patins. Sabia patinar no gelo. Mas não sabia andar a cavalo. Durante vinte ou mais anos, diziam a meu respeito: Esse aí nunca vai dar em nada na vida, pois não sabe montar a cavalo. Se eu soubesse cozinhar.Se eu soubesse andar a cavalo. Se eu soubesse cantar. Se eu soubesse dirigir carro e andar de moto... certamente, eu saberia chorar. Mas a minha capacidade de choram é, creiam em mim, minha maior virtude. Choro por meninos africanos que morrem de fome. Choro pelos meninos brasileiros obrigados a se tornar assaltantes. Choro pelas prostitutas que ficam nas vitrines, oferecendo desnudas,na Rua Vermelha, em Amsterdã. E quando eu vejo em vídeo ou cinema, filmes de Carlitos e de Oscarito e Grande Otelo, eu rio tanto que acabo chorando. O choro é a minha alegria!

                                  Roberto Drummond