POEIRA QUE VOA EM REDEMOINHO PELA RUA

Eu preciso aprender a ler, porque os textos se escondem nos breves discursos daqueles que transformam a vida em mercadoria e a expõem diariamente para quem quiser comprar. Preciso aprender a me defender, desse período de violência, dessa manifestação sem fim de ódio e ausência de diálogo que se tornou característica marcante dessa geração de jovens reacionários. Preciso aprender a me livrar, desse conteúdo decepcionante de frustrações em meus escritos, dessa lamentação por sentir as mãos atadas frente a tantas pedras que voam em todas as direções, e sim, hoje é muito pedir um copo d’água. Preciso aprender a acordar o vizinho, que finge durante toda a sua vida estar acordado, apenas pelo fato de quase tudo o que diz se enquadrar perfeitamente no discurso moralista que decorou anteontem nas postagens de redes sociais. Só uma correção, redes anti-sociais. Preciso aprender a resgatar os dias ensolarados da infância, apenas porque poderíamos parecer bobos expondo nossas melhores risadas sobre o dia de ontem. Preciso aprender a abrir os olhos, para quando toda luz vier sobre mim, ou para quando mergulhar nas águas turvas que insistem em não secar. Preciso aprender a decidir, porque em alguns momentos é preciso ter mais coragem para fugir do que enfrentar certas situações. Preciso aprender a confundir, para clarear minhas idéias e saber o momento exato que o vento se torna um redemoinho enchendo nossos olhos e boca de areia. Preciso muito aprender a ler, experimentar a angústia de poder compreender o que realmente se diz, o que inevitavelmente não consegue se esconder. Preciso aprender a escrever.