Truculências da morte: essa nossa eterna companheira
Saudações de Santelmo. Que a galáxia esteja bendizendo, em uníssono, a harmonia universal.
Para além dos processos irreversíveis de cessamento das atividades biológicas necessárias à caracterização e manutenção da vida, a morte, como sabemos, não é só isso. A morte quando induzida em um sistema outrora vivo, ou seja, o assassinato, é uma truculência, um violência, um descalabro. Mas ainda há pior do que isso. Há uma morte em vida. O indivíduo que cai na desonra é acometido ou provoca esse tipo de morte em si mesmo. E talvez essa seja a morte definitiva mesmo e não a biológica.
Faço esses preâmbulos porque são absolutamente pertinentes ao que quero explanar. Por que se a morte configura-se desde sempre um destino irremediável a todos os homens, a desonra não é assim; pois pode e deve ser evitada.
Mas não será o que ocorreu com o oficial de polícia Sófocles Mor e que está estampada em todos os boletins holográficos de informação dessa semana? O inspetor que fora designado para um caso de assassinatos em série na megacidade de Santelmo, sempre se esquivou de falar em público, mesmo quando o caso atingira o seu auge de comoção popular. Depois que “tudo acabou” e que o caso foi arquivado, finalmente se pronunciou. Ao ser acusado de necromancia, ou seja, a abjeta comunicação com os mortos para o fito de prever o futuro, -- tão utilizada na antiguidade por gregos e egípcios na Antiguidade, na Idade Média e ainda nas guerras mágicas em 3959 – ele diz que simplesmente não pensou nisso quando utilizou-se do feitiço de resgate do anel de poder. Ora, caríssimos, a memória de Katana, a feiticeira assassinada que foi objeto dessa maldita magia, merece respeito; como todos nós merecemos.
Necromancia é, como sempre foi, magia negra e, como tal, foi banida dos nossos círculos e ordens iniciáticas. O que me parece – e como membro da Ordem Mística O Conselho devo colocar – é que o Arcano 18 está propositadamente infringindo às regras e limites da democracia, a despeito de qualquer juramento desses senhores e senhoras. Sim, porque há rumores de que o assassino, cuja identidade não foi revelada, era também membro do Arcano 18. E não deixa de ser estapafúrdia a conversa de Sófocles Mor de que há infiltração de membros do Conselho no Arcano 18, membros esses que teriam a única intenção de denegrir a imagem deles. Isso é que é nos fazer de idiotas.
Mas a morte, como eu dizia, não pode ser evitada, mas pode e é, postergada. Com os tratamentos tecno-mágico-científicos da medicina atual é possível prolongar a vida para além dos 160 anos. E embora talvez nunca cheguemos aos 200 anos dos MGM (mutantes geneticamente modificados) podemos alcançar uma vida plena em ótimo estado cônscio. Mas, enfim, isso é outra coisa, porque os MGM não tem autonomia de indivíduos e são meros trabalhadores braçais, feitos para os serviços que ninguém quer fazer.
Muitos encaram a morte com hipersecreção lacrimal, aos prantos, como se isso fosse trazer o parente ou amigo de volta. Não vai. E, além disso, a morte, a despeito de toda a nossa tecnologia e conhecimentos mágico-místicos continua sendo um mistério. Não sabemos se existe vida após ela ter se abatido sobre alguém. O espiritismo valida a comunicação com espíritos já desencarnados, mas há que se ter uma diferença clara entre uma mesa mediúnica e uma consulta ao espírito do morto no plano astral. Sim, porque o médium está habilitado para fazer o intermédio entre a “mansão dos mortos” como dizia o antigo catolicismo e a nossa realidade de vivos. No entanto, qualquer outra prática envolvendo uma comunicação mortal-espiritual trata-se de necromancia.
Muitos cadáveres foram utilizados ao longo da história para esse fim. Muito foi realizado ao longo da história em matéria de magia e ritualística cerimonial mágica em práticas similares e afins. Como nos conta o relato de um bruxo, Cassiano Augustus que, em 3978, valendo-se de magia do caos e de uma egregóra puramente literária advinda do livro de Mary Shelley, Frankenstein, pôde trazer de volta à vida um homem. A magia do caos, como se sabe, experimenta qualquer objeto de pesquisa, seja de origem mágica ou não e o transporta para o universo da grande arte, sendo utilizado apetrechos tecnológicos ou não. Mas isso parece não ter tido efeito quando duas semanas depois o “renascido” veio a óbito pela segunda vez e nada concreto foi observado disso. E se tivesse sido bem sucedida, seria uma anomalia, uma aberração.
Essa ânsia por ser eterno não pode ser saudável. Afinal, viver eternamente traria problemas tão graves que mesmo Jesus optou por subir aos céus depois que ressuscitou. E como dito em São João 3,13: “Ninguém subiu ao céu senão aquele que desceu do céu.(...)” E por isso, embora tenha até agora aqui nas minhas explanações reiterado o argumento científico-mágico atual, devo recordar aos meus leitores que existe vida antes do nascimento e vida após a morte, pois somos imortais, nossa alma é imortal. E é por isso que sou um Grão-mestre mago do Conselho, além de cientista e é por isso que luto contra qualquer das vilanias que atentem contra o Reino como as do Arcano 18 e
suas práticas de necromancia.
A morte, na verdade, não é nada mais do que nossa eterna companheira nessa jornada com o espírito da galáxia e do universo. As truculências dessa mesma companheira só ocorrem quando morremos em vida, quando estamos em desonra. Não quero com isso demonizar qualquer que seja a vítima – e todas as vítimas do assassino tinham ligação com o Arcano 18 sendo membros – nem inocentar qualquer que seja o criminoso – e o provável assassino também fazia parte do movimento Arcano 18 -- mas o fato é que toda essa gente procurou a morte em vida, ou seja, a desonra.
Seus corpos não devem ser vilipendiados por magos necromantes de forma alguma, merecem respeito, repito. As suas almas estão na última jornada agora. Mas ai daqueles que fizeram essa estarrecedora prática mágica em prol de interesses escusos. Arderão no fogo do inferno, senão nessa vida, quiçá na próxima etapa da viagem pelo mundo astral. E, certamente, morrerão, não uma morte puramente biológica, mas sim uma morte eterna pela desonra que se abateu em suas consciências e almas.
Grão Mestre Péricles Cartagena é membro da Ordem Iniciática O Conselho e cientista do Reino de Vera Cruz do Brasil.
Coluna do Boletim holográfico de informação As notícias no. 5.616 do dia 12 de abril de 4014.
(Texto elaborado para o Desafios dos Escritores , cidade imaginária de Santelmo)