Crônica de Cingapura

Crônica publicada na Revista “SingBrasil” – Cingapura - novembro/2001

Apostei que desta vez iria fechar a coluna antes que se iniciassem as decorações natalinas da cidade. Afinal eram meados de outubro e o clima de incerteza globalizada iria acabar atrapalhando vida e vinda do Papai Noel, tão riscado e arriscado que anda esse nosso céu. Demais, o bom velhinho, bem barbudinho, na companhia serena de suas renas nem de virar alvo está a salvo.

Veja a parafernália de mísseis, obuses, howitzers, bazucas e projetis outros que andam soltos pelos ares. Dia desses apareceu no jornal um avião então, um superbomber, que faz lembrar aqueles foguetes de chuvas de lágrimas, que tanto cativavam nossa imaginação infantil atirando faíscas pra todas quinze bandas.

E no entanto, bastou dar um pulinho ali no Tanglin Shopping Mall pra comprar pouco mais que um sonrisal e me deparar com uma ereção colossal - decorativa, bien entendu - pra me dar conta que ia avançado o pre-natal. E empatar a aposta, que, mineiramente, fizera comigo somente. E olhe até chegar ao natal temos ainda festa das abóboras e máscaras de Halloween, as luzes, ganchos, o braseiro e a fé ardente do Deepavali, o peru da ação de graças. É mole?

E a campanha internacional de combate ao terrorismo parece ir de vento em popa, e nada poupa. Afegãos que há cinco anos enfrentam uma seca braba, acham-se agora sob uma chuva de petardos. Os bombardeios chamados clínicos são de mortal precisão. Mas com o seu lado humano de construção e projeção, às vezes carregam na mão, e se não matam o afegão que não se vê, nem se viu, pegam mesmo o civil. Pelo jeito os talibãs, cujos hábitos mal chegavam à idade média, encontram-se já na fase das cavernas e vão acabar reduzidos à idade da pedra. Lascada. Ou a pó?

Falar em pó, instaura-se o pânico na terra de Tio Sam. Tudo agora por causa do antraz - não confundir com Amtrak, que é trem deles mesmo.

O antraz parece vir de país mais antrazado, desses de araque, que só pensam em cultivar bactérias em cima de misérias, reservando o melhor lugar para tudo o que é programa militar. Esse assunto ainda vai dar pó pra não cheirar.

Ciprograme. Entretanto, correr à farmácia agora é como procurar cipro na cabeça de cavalo. E não pára aí o ciproquó, pó. Gracejo a parte, é preciso, no entanto, que se aperte, se combata e se condene toda e qualquer forma de terrorismo, do fundamentalismo ao obscurantismo, do derrotismo ao triunfalismo.

E os líderes da APEC reuniram-se na China para darem novo rumo, ou ao menos, um aprumo, nas economias dos países da chamada bacia do Pacífico. Tudo ia passando despercebido dos olhos do mundo, até que posaram com aquelas túnicas chinesas. Nada contra o eventual Versolatto de Shangai, mas, Santo Pai, podiam ter chamado o Joãosinho Trinta pra carregar menos nas tintas animar a coreografia daqueles quase trinta chefes de governo. Ainda bem que não posaram juntos com os/as respectivos/as consortes. Sorte? Imagine que jeito de china teria a Senhora Putina, ainda conservada, quase menina? Dona Laura, conservaria sua aura?

Dois a zero, foi o quanto ganhamos do Chile de Salas, rumo à Copa. Mas sem sair do quarto. Ah, como está sendo dura essa disputa pela quarta vaga. A Argentina já segurou a sua, Paraguai e Equador só precisam de mais uma rodada para confirmarem a classificação e nós, ainda com o Uruguai nos calcanhares, por jardins, matas, paúis e pomares. Enquanto eles pegam o Equador no meio da cordilheira, temos que subir a serra inteira e com a Bolívia, nas alturas, não fazer besteira. E se ficar de Cochabamba, aí é que samba. Temos que chegar até La Paz e usar todo o gás. Quatro pontos é o que precisamos matematicamente em dois jogos. Isso se o Uruguai, extremamente econômico na artilharia, não disparar a fazer gols a riviria. Quer saber mais de nossas chances, fale com o Oswald de Souza, se ele não tiver virado banqueiro.

No tênis, nosso Guga parece ter perdido o eixo, mas não por desleixo, pois ainda mantém elevado o queixo. Cinco derrotas seguidas, quatro delas em primeira rodada de torneios. Mas, nem dá bola, ao que consta, e pelo que contam, teria entrado na rota do cupido, sonhando colorido, aquele menino comprido. E, pensando bem, este é o melhor ano de sua fenomenal carreira: ganhou seis títulos. Agora a luta maior parece ser a conquista do coração de sua musa. Love game?

Rubinho, o velocista, fechou o ano em terceiro lugar. A rigor, só disputava o vice, já que Michael Schumacher, de ano a ano mais soberano, não perdeu o viço, nem das vitórias o vício. Desde o início. Na última corrida, em Suzuka, deu no Rubinho a maluca de fazer três paradas nos boxes, ao invés das duas convencionais. De pneus novos, fez ultrapassagens arrojadas, deu belas arrancadas, mas no frigir dos ovos, foi terminar em quinto, mostrando que perto do Schummi ainda é pinto. Mas e esse Montoya, que embalo, não demora irá cantar de galo.

Vêm aí as eleições legislativas aqui, em 3 de novembro. A novidade é que a campanha é curta, 17 dias, e os distritos eleitorais foram redesenhados, fazendo lembrar um pouco o que foi feito com a Arquidiocese do Cardeal Arns quando a influência dele parecia fazer sombra ao Vaticano. João Paulo não tremeu, e de sua santidade, se valeu. Com o escasso tempo de campanha, a oposição menos apanha, e em termos de apresentação de novas idéias, não há margem nem pro nosso Enéias. Há quem duvide que o PAP (Partido da Ação Popular, que ganhou todas até agora) não pape mais esta?

Enquanto isso, na terra em que florescem as laranjeiras e canta o sabiá, a corrida eleitoral também começa a ganhar contorno antes que entre no forno. No ninho tucano muita agitação mas ainda falta definição. Sobe Serra, desce Serra, o bom cabrito não, erra.O PT sem novidade, é Lula, com sua persistência de mula, que vai pra quarta candidatura. Emplaca, ou empaca? No PMDB, Itamar em trapalhadas se mete. Será que ainda eriça o topete? O Ceará apresenta dois precandidatos: Tasso e Ciro. Será que o Padim Ciço, que não é santo, irá aguentar tanto? O PFL é que fica na moita, achando toda essa gente muito afoita, afinal

quem nunca foi oposição há de perder tempo com eleição? E tem mais: Brizola, Benedita, Roseana, o Salim Maluf, o Quércia, o Suplicy e tantos outros, salvo engano. Deixemos para o ano?

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 24/09/2014
Código do texto: T4974151
Classificação de conteúdo: seguro