MEU INCESTO EM PROSA

Nos dias atuais poucas coisas ainda têm o poder de me surpreenderem, todavia, confesso que fiquei espantado com a opinião de certos leitores acerca do conto que abre o meu último livro e cujo título dá nome à obra: “você não devia ter escrito esse conto imoral” apressaram-se logo os censores a promoverem o julgamento e a condenação. Outros simplesmente disseram: “nossa, é muito pesado”! Motivo: Os Pecados de Uma Mulher conta a triste história de um romance incestuoso.

O fato é que não sou nenhum desbravador desse tema na literatura. Só para ficar em um único exemplo, em Os Maias, obra do grande Eça de Queirós, Carlos, mesmo depois de descobrir que Maria Eduarda é sua irmã, opta por continuar mantendo seu relacionamento amoroso, nada revelando a ela. Já no caso da minha narrativa, quando uma das personagens envolvidas descobre que está mergulhada em uma relação de incesto, esta rompe imediatamente o relacionamento sem hesitar.

Penso que o julgamento do meu livro, feito sob uma ótica puritanista, decorre do conhecimento por parte de alguns leitores, do meu engajamento no Movimento Espírita.

Ora, pintar o quadro de um mundo imaculado é uma atitude própria dos hipócritas; pior ainda é o julgar-se moralmente superior aos outros, numa tola demonstração de orgulho.

Gostaria de fazer uma pergunta aos puritanos de plantão: se não somos capazes de compreender e ser indulgentes para com algumas personagens fictícias, como então poderemos compreender e amparar as pessoas que, por fraqueza ou ignorância, caíram no lamaçal dos equívocos, as quais adoramos chamar de irmãos? Eis aí a hipocrisia; pregar o amor enquanto pratica a intolerância.

Sim, Os Pecados de Uma Mulher é uma dessas narrativas que chocam. Contudo, como na obra de Eça de Queirós e tantas outras, esses choques servem para nos levar a um estado de reflexão dentro do ambiente seguro da ficção.

Como escritor, sofro quando as minhas personagens sofrem e fico feliz quando triunfam; e se ensino algo a elas, também posso aprender muito com essas personagens, porque no fundo, o que chamamos de inspiração é apenas um processo de permuta.

Seria uma pretensão presunçosa esperar que todos os que me leem gostem do meu trabalho. O estilo de um escritor pode agradar bastante a um, e desagradar profundamente a outro. Ao escrever essa crônica, minha intenção é tentar fazer com que as pessoas, que em sua maioria praticam um preconceito e um racismo velados, saiam ao menos por alguns instantes da sua posição hipócrita ao analisar uma obra de um escritor, músico etc.

E já que citei o racismo, informo-lhes que descobri a qual raça os brasileiros pertencem por gênese: um país de mestiços só pode ser vira-lata. Algum problema?

Os pecados de uma mulher (o conto) encontra-se disponível neste site para leitura. Nota do autor.