Picanhas e Guaiamuns
Na lua de mel do nosso casamento, resolvemos fazer um tour pelo Nordeste Brasileiro. Isso que lhes vou contar aconteceu de verdade, não pensem que eu inventei coisa alguma; não inventei nada!
Saímos, portanto, de Salvador e fomos direto para Maceió, início da nossa peregrinação, ficamos um ou dois dias, não lembro, Pajuçara, Praia do Francês... – ah, foi lá que aquela cena me deixou bastante perturbado: uma garotinha de uns onze anos de idade alternava entre vender ostras frescas aos banhistas e cuidar da sua Barbie. Trocava a roupa da Barbie, fazia massagem na Barbie, dava banho na Barbie... Detalhe: a Barbie não tinha cabeça...
Após alguns passeios, moquecas, caldeiradas, picadas de mosquito e alguma assadura que Hipoglós nenhuma desse mundo desse conta, decidimos pelo próximo destino: Recife, com o voo marcado para as três da tarde daquele dia; - eram dez da manhã e, deduzidos os procedimentos de rotina – uma hora para chegar até o aeroporto e mais uma hora para o check-in, contabilizávamos uma boa folga técnica de tempo: vamos beber alguma coisa, mô...
Aquele letreiro gigantesco na fachada do restaurante logo me chamou a atenção: “ESPECIALIDADE DA CASA: PICANHA NA BRASA.” - é aqui mesmo, mô! – entramos.
O garçom veio nos atender, parecia o José Dumont quando fazia aquele filme “O homem que virou suco” – tinha um meio sorriso misterioso. Pedimos uma cerveja e ficamos no maior love aproveitando preâmbulos – só sabe o que é isso quem namora. Pedimos outra cerveja... mais outra cerveja e... ei, garçom, essa picanha tá boa mesmo?
O garçom se aproximou da nossa mesa com aquele meio sorriso misterioso, serviu a cerveja, recuou um pouco, andou a esmo de um lado para o outro, depois em círculos e, de repente, estancou ao meu lado. Apoiando uma das mãos sobre a nossa mesa, curvou-se e iniciou em um tom confidencial: tem um probleminha... - Qual era o probleminha? – eu queria a picanha na brasa, a especialidade da casa! A picanha – completou – tá congelada... e sumiu no corredor. Manda chamar esse garçom, ô, garçom!
Ele veio. Tem horas em que você percebe que explicações são tão úteis quanto água em pó – ah, uma faca aqui! - Meu filho, – argumentei, perdendo a fleuma – já estamos na terceira cerveja; a nossa fome está soberana, o que é que você tem aí que não esteja congelado?
- Pra almoçar? – perguntou - não respondi, ele entendeu, e então nos disse que tinha uma carne do sol com pirão de leite, leva obra de quarenta minutos para ficar pronta; sai no capricho, senhor. Olhei para o relógio e me desesperei: meio dia e meia; paciência, pode preparar... olhe, estamos com muita fome, o que você tem que possa servir como entrada? Falou de guaiamuns, mandei descer.
Após uns quinze minutos, pude perceber o garçom, lá do outro lado do restaurante, fazendo novamente aqueles movimentos estranhos, indo de um lado para o outro. Ressabiado, acenei, ele veio: - senhor! – Cadê esses guaiamuns, rapaz, já faz um tempão que eu lhe pedi! – ah, de novo aquele meio sorriso, dessa vez com outra explicação:
- Sabe, senhor, o freguês é que tem que escolher, tá tudo lá dentro das gaiolas comendo milho. Tem os mais cevadinhos e os menos cevadinhos... que tipo o senhor vai querer?