Tenho medo!
Tenho medo!
Decerto, você parece não se preocupar com o julgamento que sua obra terá. Aponta a sua caneta e destrói castelos erguidos, há milênios, como se fossem de areia. Sua palavra é pedra de atiradeira, é petardo, é crime contra a atrofia intelectual. Mas, o que percebo, é que há mais coisas escritas nas pausas e nas margens que no próprio texto. Você deixa espaços vazios, pois sabe que o tempo não é de agora. Tenho medo da incompletude dos seus textos! Cada ponto é seguimento e cada parágrafo é começo.
Certa vez, perguntei sobre sua arte e respondeu:
- Não sou cúmplice de minha obra, ela é culpada por todos os crimes que vier a cometer!
Tal afirmação me assustou! Que crimes pode a palavra cometer? Não entendi no momento em que proferiu tal frase, mas, logo em seguida, compreendi. Sua obra é armada com todos os sentidos e busca a implosão de formas e fôrmas estabelecidas. É, caro bandido, é caro para a vida certos textos que falam o que deveria estar mudo. Você é cacimba no deserto, matando a sede dos sedentos de realidade. Mas o que é o real?
Não obtive sua resposta, apenas recebi uma bofetada na face e uma pergunta:
- Acordou?
Como posso estar dormindo se meus olhos estão arregalados? Novamente, deu-me uma bofetada e respondeu:
- Acordou?
Realmente, devo estar dormindo e, certamente, o despertador são suas palavras. Na verdade, você será condenado; réu póstumo. Mas, o crime prescreverá, pois não haverá mais alguém, todavia, obras. Não há prisão que coloque grades em suas palavras, nem cadeados que travem seus sentidos. Você jamais será julgado; não há justiças para lhe condenar, mas haverá alguns que lhe encarcerarão no silêncio e na solidão de uma estante empoeirada. Mas você sacudirá a poeira e fará a vida sentir alergia de suas palavras.
Mário paternostro