O SER MALUCO

O SER MALUCO

Algumas pessoas me consideram maluco. Certa vez fui visitar um amigo e ele estava lendo uma crônica que escrevi, aquela na qual eu fazia previsões de como seria Campo Grande daqui a cinqüenta anos. “Esse cara é maluco”, ele disse, sem perceber que estava diante do maluco. Aceito a pecha sem reclamar, realmente sou um tanto estranho: gosto de escrever e sei que às vezes meus textos caminham pelo anacoluto; faço teatro; sou Botafoguense. Claro que não sou normal. Mas o que é exatamente ser um maluco? Ser maluco, na essência, é enxergar o mundo de uma maneira diferente. E apenas isso: diferente. Porque nenhum maluco é santo, comete erros, alguns de deixar os cabelos dos ditos normais, em pé. Ser maluco é não viver numa redoma, é ter ciência que a vida é bela e esconde alguns tesouros que precisamos procurar, mas assim como tudo que é belo, é efêmera, o tempo passa rápido, as vistas cansam, a coragem esmorece, então é preciso viver intensamente. Ser maluco é comprar todos os chapéus que vê e depois não usar nenhum. E na insanidade dos atos, ter medo de rato e encarar o leão. Maluco gosta de ouvir aquilo que ninguém consegue escutar. E antes que alguém se assuste, vou logo afirmando que não ouço vozes do além, mas percebo alguns assopros que ninguém dá atenção, porque provavelmente é a voz de outro maluco. Concentro-me exageradamente em coisas fúteis, encafifo às vezes que algo é verde, mas que, olhando de perto, pode ser azul. O maluco é aquele bêbado que vê graça em tudo, que ri à toa, até de si mesmo, que chama o sol de estrela, a minha estrela predileta, porque na verdade o sol é mesmo uma estrela. Sonha com discos voadores, com artistas que admira, escreve umas bobagens e pensa que é obra prima. Tolo. O maluco é um tolo do sangue bom. Mas não confunda maluco com louco. O louco pensa que pode voar, o maluco sabe que se tentar voar, vai cair e quebrar a cara. E eu não sou o único, existem muitos outros malucos espalhados por ai: é aquele cara que sabe que a mulher é uma rosa, e como toda rosa, tem perfume e espinhos. O maluco acha ridículo o que consideram certo e sente vergonha quando tem razão. Prefere o silêncio, não o absoluto, mas a quietude suficiente para ouvir o próprio coração. Eu sei que depois da vida existe algo mais, mas não sei o que de fato seria o grande talvez. Então, faço em casa minha oração, dirijo palavras a um Deus que desconheço, diferente daquele que dizem os normais. E no meio da multidão, sou um dos poucos que acredita que Epícuro tinha razão e que a teoria das cordas ainda vai dar o que falar. Para o maluco que sou, tanto faz a sobriedade ou mais um porre. Espere! Isso é letra de uma música brega antiga. Adoro música antiga, até mesmo as bregas. É mais uma de minhas maluquices: curtir no rádio do carro Lou Reed e logo depois Odair José.