No ar
Está frio lá fora. Muito abaixo de zero. Céu escuro, negro mesmo, mas o jardim... Esse possui lindos tons de verde. Um tapete de inúmeras gradações. Ao fundo, o azul que reflete prata em multipontos. Inimaginável a sensação de poder partilhar, interagir, aproximar mais e mais na imaginação... E permanecer como integrante assíduo daquele habitat, mesmo a essa distância, como expectador fortuito. Do outro lado, o esquerdo, a realidade construída pelo homem por mais que seja um feito digno de grande admiração, não se impõe, pelo contrário: apenas usufrui. Na verdade, exibe uma fragilidade contagiantemente trêmula e instável despertando os afeitos a uma claustrofobia velada à espreita de algum sobressalto para se revelar pânico. À direita o branco se esmiúça e espessa em mil tons sutis intercalando-se às cores. É de mim cuidar de ver o que me dá mais consciência do insignificante que somos ao invés de me deleitar ignorando estar ali. Saber do impróprio que é; do estranho que somos enlatados numa engenhoca planadora impulsionada artificialmente. Um dos dois piores momentos está se aproximando: a preparação para o pouso (o outro foi a decolagem). O prêmio de consolação a esse suspense é a visão progressivamente mais próxima da cidade. Os segredos começam a ser revelados. O lúdico, aos poucos se transforma em maquete animada e a realidade brutal do choque controlado junto com desaceleração súbita me traz de volta à realidade dos sobreviventes.