Diálogo entre o nativo de boné e a repórter

O interfone chama. Atendo! É Florbela do jornal...

Peço que aguarde, vou atendê-la. Entro no meu JEEP FORD 54, toco até o portão.

Vejo Florbela e mais outros.

Me identifico, ela agradece e pede desculpa.

Mas o senhor está saindo? Queria falar agora com o senhor.

Digo: Sim

Entre no JEEP e aguarde que eu feche o portão.

Ela: Mas...

Digo: calmo como sou, fico alegre quando tenho que buscar alguém no portão. Assim meu velho JEEP exercita seu motor.

De ré faz o percurso inverso até a cobertura de zinco.

Peço que desçam e sentem nas poltronas de pele seca, na varanda.

Vou até a cozinha, bebo um trago d’água de moringa. Trago e ofereço aos visitantes. Ofereço em taças de cristal. Pura e fresca como nunca viram.

A repórter: Queria fazer algumas perguntas sobre...

Digo: se queria, então não quer mais. Porquê?

Mas se ainda quer posso atendê-la. Faço um elogio à sua face. Toco sua bochecha e digo com honestidade sem demagogia. Que rosa linda é seu rosto! Uma cor que me deixa soberbo, porque assino Rosa.

Ela sorri marotamente e quase sem jeito pergunta:

Como escolheu este lugar para morar? Com uma resposta simples fiz risos entre eles.

O único lugar que me quis.

Fale um pouco de sua rotina neste lugar:

Quase sem querer, tomo uma água morna. Mastigo um favo de mel, escovo os dentes, coloco meu boné e me ponho na varanda encostado na coluna de parajú. Aprecio o vento nas folhas, vejo o sol castigar as sensíveis flores. Peço paz para as plantas inocentes.

Fico ali olhando o tempo.

Lembro que combinei levar o café para limpar.

Coloco o tênis caro para caminhada e corrida. Bermuda de anos atrás. Camiseta sem propaganda. Caminhando 10 km peço um favor. Voltando agradecido, me desnudo, ligo a mangueira no hidrômetro da COPASA e me delicio com o frescor daquela água.

Porque optou por viver aqui, assim?

É porque foi aqui que me acolheu como sou.

Falo bom dia, boa tarde e nem digo boa noite porque não tenho para quem dizer.

Como é sua noite? Vê televisão?

A noite não é minha; não sou egoísta. É de todos.

Televisão não sei ligar, porque não tenho.

Como se informa? Fica sabendo das noticias?

Me informo com o tempo.

As noticias boas sinto no ar puro, inocente.

As más ouço nas fofocas pela bocas malditas, que soam pelo vento.

A última pergunta Sr... Como é dormir sozinho neste lugar?

É muito tranqüilo e sem trabalho. Desligo todas as lâmpadas, coloco um copo d’água próximo à cama. Cubro como nasci, apenas com minha pele.

Faço minha oração com os olhos fechados e digo amém.

Que tipo de oração o Sr. Faz?

A última pergunta você já fez ... mas...

Faço a oração do desejo.

Jose Hilton Rosa
Enviado por Jose Hilton Rosa em 30/08/2014
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