Uma Solteira
Finalmente!
Abriu a porta jogou os sapatos que lhe apertavam os pés, a bolsa no sofá e as chaves do carro na mesinha de centro. Pensou como um sopro passageiro sobre esta última que estava ultrapassada, precisava trocá-la.
Deixou-se arrastar pelas pernas até a cozinha, abriu a geladeira, havia apenas uma garrafa com alguns pingos d’água. “Vai esta mesma”, as outras estão vazias. Não era sede, apenas necessidade de colocar algo pela boca dentro de si já que não poderia expulsar o que havia de ruim dentro dela.
Arrastou-se novamente até a sala e caiu subitamente no sofá que fez um “treck” como se algo pesado o esmagasse. “Estava precisando emagrecer! Que nada, o sofá estava velho como a mesinha de centro”. Melhor ver televisão, pois sua mente estava se ocupando de pensamentos idiotas. Deve ser estresse!
“Cadê o controle da tv?” Teria que levantar para apanhá-lo ou continuaria devaneando. “Melhor ligar logo essa tv e ver qualquer coisa!” Pegou o controle. Click, novela. Click, jornal de notícias policiais. Click, desenho animado. Click, propaganda de móveis! “Nossa, o sofá está com ótimo preço e de brinde uma mesinha de centro”! Muda o canal e resolve deixar na novela mesmo. Que chato isso, pensava, mas não queria lembrar-se de seus objetos velhos nem do dia de trabalho exaustivo.
O sono chegou como um abraço confortante e curtiu prazerosamente aquele afago aninhando-se no sofá. Relaxou e deixou-se envolver pelo cansaço. Toca o telefone celular e ela desperta assustada atendendo no impulso. “Mas que inferno, engano de novo”! Olhou a hora e lembrou-se que precisava de um banho. Iria dormir sozinha como de costume que, aliás, por escolha, pois não suportava a ideia de dividir seu espaço com outra pessoa tão desorganizada quanto ela. Desorganização que por sinal gostava muito, pois lhe trazia sensação de liberdade, fazia o que tinha vontade, dona de si e de seu lugar.
Sobre o banho mudou de ideia, precisava mesmo era comer algo. Voltou a lutar com a preguiça, cansaço, ou seja, lá o que fosse e foi até a cozinha. Abriu a geladeira e nem àgua tinha porque já havia tomado a última garrafa que não encheu para tomar depois (como de praxe). Nunca se lembrava de passar no supermercado mais cedo. Teria que sair, para comer, mais uma vez.
Ligou para uma amiga convidando-a. Foi até o quarto olhou os cabelos maçarocados pelo carinho do sofá e escovou-os. Passou batom, pegou a bolsa, as chaves do carro na velha mesinha de centro e saiu. “Quando voltar tomo um banho”. Talvez ela voltasse acompanhada. Às vezes isso acontecia, não por acaso, só quando realmente queria.