Será isto, amor?
Manhã de sábado do mês de agosto, sol quente, dia lindo e muito burburinho na Boca Maldita.
Um fato chama a atenção de Joaquim, a saber, a presença de muitas pessoas passeando com cães, e a ausência de crianças.
A Boca Maldita, palco de manifestações políticas de Curitiba, estava cheia de candidatos e cabos eleitorais de todos os partidos. Destacava-se o embate entre duas correntes do mesmo partido político que se enfrentavam ou se afrontavam, conforme a preferência do leitor.
A tudo Joaquim estava atento. Mas para todo lado que olhava sempre via alguém com um cãozinho a tiracolo. Alguns chamavam os cães de filhinhos, outras diziam para os animais ficarem juntos das mamães.
Para não dizer que não viu criança naquele concorrido espaço, Joaquim afirma que viu uma. Era adolescente, aproximadamente 10 anos, e caminhava desacompanhado de seu papai e de sua mamãe.
Pensou que muitas pessoas estão preferindo dedicar seus afetos a cães e gatos, e não mais para as crianças. Estariam estas pessoas no caminho certo a preferirem animais a seus semelhantes menores?
Viu cãezinhos que pareciam uma almofada, porque seus pelos pareciam fofos e as pessoas paravam para apalpar e se deliciar. Uma entrega total aos animais. Pensou que o problema não é o afeto dedicado aos animais, e sim a ausência de afeto com as crianças. Lembrou que ao longo da história o cachorro sempre foi um amigo fiel do homem, porém isto não impedia os homens de amarem as crianças.
O leitor sabe que reflexão quando começa sempre tende a se aprofundar. Então um pensar lhe ocorreu, seria a atual relação de muitas pessoas com seus cãezinhos, amor? Da parte dos cães não há a menor dúvida. E da parte das pessoas? É muito fácil amar um cão porque se alimentá-lo e adestrá-lo ele fará o que o proprietário quiser. Com uma criança não se dá do mesmo modo, porque criança chora, responde, desobedece. Outra pergunta lhe surgiu, a saber, o amor não tem que ser incondicional? E ainda outra, se o amor é condicionado não seria egoísmo? E mais uma, se o cão pertence ao proprietário seria relação de amor ou posse?
Lembrou que já ouvira algumas teorias de que os animais, por seu amor incondicional, têm a capacidade de despertar o amor em pessoas solitárias ou traumatizadas por outros semelhantes. Isto não provaria a tese do amor condicionado?
Também recordou que tem pessoas que colocam seus pais idosos em asilos, alegando não ter tempo ou condições de cuidar dos pais. Porém, não esquecem de adquirir um animal para lhes fazer companhia, e, igualmente, não esquecem de administrar a renda do idoso.
Neste momento, recordou uma história popular que ouvira. A história é a de um homem adulto que junto com seu filho, levam seu pai para um asilo de idosos. O neto vendo o avô triste pergunta ao pai o porquê daquela atitude. O pai responde que no asilo o lugar é belo e maravilhoso, e que o avô do menino será bem cuidado. Ao ouvir isto o menino responde que quando crescer já sabe onde colocar seu pai.
Entretanto, uma pergunta ainda martelava na mente de Joaquim: seria a atual relação de muitas pessoas com seus cãezinhos, amor?