Banco da praça
Sentados na praça. A mais clássica cena romântica. Ele, sentado. Ela, deitada, pernas encolhidas, a cabeça acomodada sobre as dele. Ele, com a temperatura, digna à sua idade, quente. Ela, coberta com o casaco dele. Aninhada como quem pede proteção. Os afagos no cabelo a fazem alterar momentos de lucidez e sono. Os olhos embriagados confundem as imagens e os sons se misturam. Ele aproveita para dividir seus anseios e compartilhar seus sonhos, para passar o tempo. Tem certeza de que tudo está sendo registrado. Como um contrato, onde cada ‘sim’, pronunciado por ela, em sua embriaguez, correspondesse a uma assinatura. Acordado. A voz dele soa como boa música, transmitindo segurança. A dela, pausadamente, garante a sua participação. Ali, ele traça suas metas, por ordem de importância para si. Ela, neste instante, é apenas ouvinte. Agora, acordada. Concluir seu curso. Ter uma profissão. Adquirir sua casa própria. Ter a sua tão sonhada ‘Saveiro’. Casar. Ter filhos. A ordem perfeita para os fatos,,,para ele. Ela pensa no tempo. Ele tem tempo. Ela, nem tanto. Ele, anos 90. Ela, final de 70. Já tem profissão. Já teve sua própria moradia. Já teve carro. Já casou, descasou, chorou, sofreu, aprendeu, voltou a sorrir (para ele). Não teve filhos. E deseja começar pelo fim. Sua ordem é inversa. Ele planeja tudo em seu tempo certo. Ela, não quer perder tempo. Ter filhos. Conviver com eles. Passear com eles. Brigar com eles. Fazer as pazes com eles. Ensiná-los. Acompanhá-los. Sorrir pra eles. Aprender com eles. Ser feliz com eles, por eles, para eles. Ele, carinhosamente, a observa, atento. Promete felicidade para ela. Ela sorri para ele. Ele, sorri para ela. Seus olhos nos olhos dela. Nada mais se enxerga. Do cenário, só existem ele e ela, no banco da praça.