Aquele quarto tão bonito
A porta destrancada – confiança e também preguiça de tirar uma cópia da chave. O mesmo quarto dos últimos quatro anos, o mesmo que havia deixado ainda pela manhã – mas quanta diferença! Acontece a cada duas semanas: antes de sair para trabalhar, dá uma geral na casa, coloca as coisas de volta em seus lugares, se livra de coisas que devem ir para o lixo, coloca as roupas sujas dentro do cesto destinado a elas, e com isso tudo tem a ilusão de estar entregando um quarto mais ou menos digno para a faxineira, a empregada, a diarista, ou qualquer outro nome que tenha a mulher que lhe faz as vezes de mãe. Mas é quando chega de volta, no fim da tarde, sem nem ao menos se encontrar com ela, que ele percebe não entender nada de arrumação de quartos. Só agora, depois do trabalho da faxineira, é que o quarto pode se considerar arrumado.
Sente a mudança a partir do próprio cheiro do quarto, perfumado por algum produto de limpeza. Vê o armário que julgava organizado e constata que agora sobra espaço nele. Os livros que deixava lá estão agora em uma estante – e ele é obrigado a admitir que assim ficou muito melhor. Também a mesinha parece outra, agora desimpedida dos cabos de um notebook. A roupa de cama foi trocada, o edredom está disposto com um cuidado que ele mesmo nunca teve. Os produtos na geladeira foram separados nos seus devidos compartimentos. Assusta-se ao perceber que ela organizou até mesmo as suas gavetas, onde nunca se preocupou muito com a ordem.
Sim, senhor, ela fez muitas coisas que não tinha a obrigação de fazer. Pode ser que ele demore um pouco até encontrar alguma das suas coisas, mas também não reclama: está contente por ter encontrado uma faxineira tão perfeccionista. E contempla por mais algum tempo aquele quarto tão bonito que ela preparou, certo que, dali a pouco, já estará novamente cheio de sacolas, bolsas, roupas, comida e lixo espalhados por toda a parte. Mas, por enquanto, tudo está renovado e ele tem mais uma chance.