OUVINDO CHOPIN

     Cavaleiro errante do céu, ou da terra, onde está tua princesa? Que ideal inspira teu cavalgar? Já te apaixonaste, em teus sonhos, pela fada morena, longos cabelos negros, o céu no olhar e a face acetinada que roubou o rubor das rosas?

     Por ela deve pulsar a energia do teu coração. Teu cavalo deve conhecer os passos controlados que sugere o "Scherzo en beémol mineur op. 31 Presto", de Chopin, antes de acompanhar o "Nocturne en mi bémol majeur op.9 nº 2, Andante ao partir pelo mundo à procura do troféu, sucesso das tuas lutas, para oferecer-lhe como a mais bela vitória do teu amor.

     Cavaleiro errante, tua princesa ainda é uma criança, em tua vida tudo é latência e sonho. A cada cabeça que tua lança decepar, dez surgirão. Não há mal para combater, há bem para semear. As princesas precisam ser salvas dos dragões, dos sapos, das florestas negras, dos moinhos de vento e guiadas aos jardins dos palácios, onde as flores sobrepujam as ervas daninhas.

     Em tua vida solitária, tu e teu cavalo, onde está o teu príncipe? Sim, pois nos sonhos de um cavaleiro deve haver também um príncipe, seu ajudante de armas, seu escudeiro, seu aprendiz.Quais as tarefas a lhe impor para fortalecer em sua alma o interesse de seguir os caminhos para ele traçados? Como vês, meu cavaleiro, o bravo guerreiro jamais pode repousar! A tarefa é árdua, o combate incessante;  nem sequer precisas procurar o mal a ser combatido, o bem a ser praticado. Ambos estão aí, bem a teu lado. A poção do teu druída e o vinho da Távola são tesouros, bens preciosos, teu alimento sagrado e deles deves te servir com sabedoria. Deles virão as forças para enfrentar as batalhas, mas precisarás sorvê-los sem esgotá-los, armazenar o vinho e a poção na medida certa, sem ser avaro, sem esbanjar, evitando esvair sem necessidade a sustentação da tua força. Pois na verdade, cavaleiro errante, daí vem todo teu poder para o bem ou para o mal. Estás sempre em perigo, não somente em relação ao discernimento, mas também em relação ao teu equilíbrio na forma de beber dessa fonte. A "Polonaise en lá bémol majeur op. 53, Maestoso" vem me sugerir a idéia de triunfo. Tu serás, cavaleiro das estrelas, com certeza, um triunfador. A coincidência da música com a escrita indica isso de maneira clara, pois não há coincidências, mas apenas evidências que precisamos aprender a reconhecer e admitir.

       Cavaleiro, cavaleiro, eu te vejo mais num carro puxado por dois cavalos, um branco e outro negro, cada qual indicando um caminho, uma direção. Conhece esses dois cavalos, aprende a controlá-los com teu comando firme ao empunhar as rédeas. Não temas. O sopro de alguma Helena nos céus, estará ajudando a temperar a liga do metal do eixo que sustenta as rodas. Não temas. A fibra de alguma Helena na terra, estará tecendo um manto para agasalhar-te, preparando um banho para purificar-te, as mãos prontas para espalhar pelo teu corpo o óleo com que serás ungido para te recompores das lutas empreendidas. Não esmoreça. Teu carro chegará incólume à meta traçada.



(21/04/1994)