Lá vem ele!

Um suspiro... Era terrível vê-lo passar, era uma tortura! Ele subiu e desceu escadas o dia todo, cruzando todas essas vezes por minha porta marrom aberta , deparando-se de vez em quando com meu olhar disfarçado.

Ao imaginar que eu podia sofrer um flagrante, obrigava-me a desviar os olhos para um ponto qualquer, fingindo prestar atenção em alguma coisa útil na tela do computador. Por vezes, com a testa franzida, eu me imaginava parecer culta, interessante o bastante para que ele se interessasse. Complicado demais, não? Pois é. Todas as vezes eu me mutilava por dentro, me retorcia, me odiava, pois eu sabia que ele não me via, não me queria, nem reparava. Então, cansada de culpar somente a mim, eu odiava a ele, por um instante, até novamente desfilar todo seu charme nada sutil pelo meu corredor. E eu ficava com raiva, já nem sei de quê. Penso até que eu me esqueço de respirar, porque eu só presto atenção nisso de novo quando inspiro um bocado de ar, depois de ele sumir da minha vista.

Sim, é uma tortura, mas que judiação... satisfatória! Decerto eu até gosto de me martirizar assim. Gastar algum tempo durante o expediente observando o movimento, quando o trabalho está mais tranqüilo. Como ontem, e eu cuidava dele, e o xingava mentalmente, após adorá-lo, após adulá-lo com minhas discretas fuziladas, dos seus pés a sua cabeça, enquanto ele subia os degraus em direção ao próximo andar. Até me sinto desconfortável ao perdê-lo de vista, como quando o vejo voltando, mas não me lembro de tê-lo visto ir a algum lugar. Geralmente isso ocorre em dias atarefados demais. Mas ontem...ah, como não sentir? De que maneira eu posso ignorar isso e, como sempre faço, me recuperar saudavelmente de seus passeios feitos sob a tutela do meu delicado instinto? Mas você tinha que me penalizar mais uma vez, fazendo-me perceber naquele gélido corredor o calor que da tua presença emana!

Roupas alinhadas, cabelos livremente acomodados, andar tranqüilo, postura imponente, lindo como sempre. Eu? Eu estava mais perto da porta que o comum. Andar tranqüilo, olhar fingido, ansiosa como sempre. Ele quase todas as vezes espia para dentro do meu setor, eu tento parecer que não reparo e seguimos nossas vidas. Acredito que isso ele faz de propósito! Busca encontrar meu olhar só para se mostrar forte e desfazer de minha pessoa. E daquela vez seu plano deu mais do que certo. Quando ele veio passar na entrada da sala, não pude prever. Só me dei conta quando já estávamos nos cruzando, um olhou fixamente nos olhos do outro, pelos cinco minutos que se seguiram, lógico, só na minha cabeça. O que houve durou apenas um segundo, mas eu tenho certeza que foi nos meus olhos que ele mirou! Como pôde seguir em frente, assim, tão cotidianamente? Eu estava só, decerto, durante nosso encontro... Onde estava o seu coração, se seu corpo esteve diante de mim? Foi muito injusto, eu não estava preparada. Aquela cena se repetiu diversas vezes em minha mente, minha essência parecia energizada, o bastante para que eu pulasse no seu pescoço. E embora a intenção fosse bater, eu iria querer beijá-lo. Claro que isso, de me atirar nele, nunca aconteceu, e nem vai. Nosso incidente só serviu para provar a ele o quanto ele é bom no que faz. Serviu para me fazer perder o chão, chegar ao ápice e retornar a base, feito um cão obediente. E para me desmoralizar de novo, e de novo, e de novo...

Hoje, cá estou à prontidão de um assobio agudo. Relatando minha aflição numa página em branco, pra preencher o espaço vazio que ele se recusa a ocupar.

Talvez eu só tenha bronquite ou asma. Talvez esse encanto se esvaia de vez, muito em breve. Talvez...espera! Lá vem ele! Ponto fixo, parecer interessante, vou escrever alguma coisa jnsifiuhoipawjfgoierjgp opkW POKQokpaswf kofijop KIJIOJIJijijijsd jidf.......

E assim caminha a humanidade.

15.08.2014

Kendra Hintze
Enviado por Kendra Hintze em 15/08/2014
Reeditado em 04/12/2014
Código do texto: T4923968
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