O DIA EM QUE AS CARTAS FALARAM A VERDADE
O ser humano em um determinado período da vida faz cada besteira que quando amadurece percebe como fora ingênuo e burro. Estamos, na maioria das vezes, sujeitos a pagar mico. É inevitável. Numa dessas fases, quando ainda não existia internet, e-mail e muito menos Facebook, todos em que conversavam cara a cara. Os desaforos eram ao vivo e a cores. Quem quisesse falar ao telefone, teria que marcar horário, as bibliotecas eram cheias e agora só e-books e salões completamente vazios; os discos estavam começando a virar cd. Bons tempos aqueles, meados de 1994.
Naquele tempo, vi um anúncio em uma revista dizendo o seguinte: “Aprenda a colocar cartas em um mês. Peça já o seu kit com manual de instruções incluso”, Quando li procurei logo saber o endereço para correspondência, e fiz o pedido. Em menos de uma semana recebi um formulário e um catálogo com vários kits. Escolhi o tarô cigano. Driblei minha avó e consegui o dinheiro, claro que ela não iria gostar nadinha se soubesse dos meus planos.
Depois de quase um mês de espera, o pacote chega e corro para o quarto louquinha da vida querendo aprender e pôr em pratica o mais rápido possível à brincadeira. A princípio, eu achava que era brincadeira, até que um dia aconteceu algo muito estranho.
Fui passar um final de semana na casa da minha tia avó, Císera. Adorava ir para lá porque reencontrava minhas primas e conversávamos muito, sem contar nas escapulidas que dávamos até a pracinha da esquina para paquerar. Numa dessas visitas levei as cartas por que elas pediram para descontrair um pouco.
Perto da meia noite, fomos para um quarto que ficava nos fundos da casa. Havia um sofá-cama e uma mesa com alguns livros. Costumávamos ficar por ali até chegar o sono. Chamei todas as primas, cinco no total: Beth, Silvia, Roberta, Maria e a Joana. Retirei o tarô cigano da bolsa, concentrei-me e comecei a colocá-lo sempre em cima de uma flanela vermelha.
A brincadeira havia começado de maneira descontraída. Apenas eu entendia o que as cartas diziam, pois havia decorado os significados delas. De repente, percebi que a carta com o símbolo do caixão que representava a morte, havia caído para todas elas. Achei estranho e comentei sorrindo para elas não ficarem com medo, por que até então, não passava de uma descontração e coincidência.
Fomos dormir. No dia seguinte fui acordada pela prima mais nova, Beth, aos prantos me xingando de tudo que era palavrão, chamando-me de bruxa e feiticeira. E sem entender nada, levantei um pouco assustada e perguntei sobre o que ela estava falando. Não esperei a resposta, saí do quarto e fui até a sala saber do ocorrido. Todas estavam chorando. Aproximei-me e quando ia perguntar o que havia acontecido vi próximo a elas o cachorro labrador Totó, morto. Agora eu entendia o motivo dos xingamentos. O símbolo do caixão na carta confirmou a morte do cachorro da família.
Fiquei tão assustada que dei sumiço às malditas cartas no mesmo dia. Coincidência ou não, a verdade é que eu não queria ser acusada de mais uma morte de algum animal da vizinhança. Deus me livre.
Tá vendo a besteira que fiz para suprir uma curiosidade? Quase ganhei um apelido de feiticeira para o resto da minha. E vida que prefiro nem lembrar.