Parabéns do mesmo jeito
Vovô tem a sua própria cadeira, uma mobília velha, de madeira e com assento de palha. Fica na cozinha, encravada entre o fogão e o armário, voltada contra a janela. É lá que se senta tão logo sai do quarto, é de lá que ouve a conversa geral na casa e, de vez em quando, solta frases espirituosas, um pouco mal-humoradas, que é o jeito dele fazer a gente rir. Se as pessoas vão para fora conversar ou tomar um pouco de sol, vovô continua sentado no mesmo lugar, sozinho, acompanhado apenas da televisão. As partidas de futebol, de modo especial, ele não perde.
Já está perto dos 80 anos, mas ainda não sabe que não chegará a completá-los. Dali a algumas semanas terá partido, e dessa vez será para valer (antes disso, ele chegou a morrer por duas ou três vezes, em uma delas, inclusive, com direito a visão do céu, e só voltou porque uma voz lhe explicou que aquela ainda não era a sua hora). Tem um coração de leão, diz o médico. Mas também é um coração bastante sensível, que mais de uma vez previu o futuro, que pressentirá o próprio fim e que irá chorar por saber que aquela é a última vez que está nos vendo.
Quis o destino que fosse no Dia dos Pais. Era ainda de manhãzinha quando chegamos de viagem e vovô não havia saído da cama. A família conversava na cozinha, contava as novidades de quem não pode se ver mais do que três ou quatro vezes por ano. De repente, vovô apareceu no corredor. Olhou com surpresa para nós, pois não sabia que viríamos. Sorriu e reconheceu que havia ouvido mesmo umas vozes estranhas na casa. Estava bem disposto e eu me levantei para cumprimentá-lo pela passagem do dia. Ele agradeceu e deu parabéns para mim também. Acontece que eu não sou pai. Tentamos explicar isso a ele, mas vovô não se deu por vencido:
– E daí? Merece parabéns do mesmo jeito.
Caminhou então até uma sobrinha, que também fazia uma visita, e lhe estendeu a mão:
– Parabéns, Teresinha! Parabéns!