Solidão pela manhã


Era cedo, muito cedo, e o homem estava quieto, sentado no banco daquela parada de ônibus. Esperava. Sua diversão, para passar o tempo, era observar. Observar alguém, em especial ou, geralmente, todo mundo, com um misto de desprezo e suspeita.

O veículo brecou e a porta se abriu. Pisando nos degraus, um a um, vagarosamente, desceu apenas uma mulher.

Não era uma mulher comum. Ela era bonita, vestia um uniforme, quem sabe de recepcionista ou balconista. Tinha os olhos claros e os lábios enfeitados por um batom extravagante. O homem reparou. A mulher se foi. 

 E lá estava ele, novamente só.  O homem quieto sentado no banco daquela parada.

Demorou um tempo que ninguém mediu, até aparecer um outro ônibus. Brecou, e dele desceu um menino, estranhamente só.  Nenhuma pessoa com ele. Só, como o homem sentado no banco daquela parada.

Era um menino moreno, usava óculos e seu tênis estava rasgado de lado, de maneira que dava para ver a meia azul que o pirralho usava. O homem reparou. O menino se foi, e os ônibus demoravam.

O movimento da rua aos poucos aumentava.  Já não era tão cedo. O homem reparou. Era o mesmo  homem quieto sentado no banco daquela parada.

Agora no banco, sentadas junto a ele,haviam uma senhora e sua netinha.

Ele se incomodou, não suportou tanta companhia.

Levantou-se sem observar mais nada, nem ninguém e sumiu dobrando a esquina. Voltaria só amanhã de manhã. Bem cedo.


Esse texto faz parte do livro
 Ponto de Encontro,
de Marco A Hailer, Solange Aranha e Bel Massoni.
Editora FTD, São Paulo, 2009.