MINHA PAINEIRA: MAIS DO QUE ELA MESMA



 
      Minha paineira é ela e mais do que ela mesma. Ela representa, também, para mim, por força de certas circunstâncias, já há muito, muito tempo, a natureza inteira. E também representa-me a mim mesma, à primavera outonal ou, em outras palavras, ao primaveril outono que me habitou e não apenas a mim, não apenas... Então, forçoso é dizer que ela, minha paineira, me representa a imagem de um homem, também,  a imagem de um homem no seu outono primaveril.
           Tais evocações que há em mim, sempiternamente, porque a tenho, paineira, todo o tempo diante do  olhar, nunca me permitem esquecer nada da minha história. Aliás, se há algo que os deuses jamais me permitem é o dom do esquecimento, não apenas em razão de  memória implacável: não apenas.
               De alguma forma, falo dessas e de muitas outras coisas no livro "Flores do Outono", que foi publicado em 2008 e que postei como e-livro no Recanto. Falo, nele, da paineira em sua "primavera", falo de mim, falo de outro ser, falo de eternidade e falo de impermanência. A eternidade é a permanência dela, paineira, ao longo dos anos e das estações, mudando sempre e jamais deixando de existir. Claro que um dia ela também morrerá; meu conforto é que ela nasceu antes de mim  e um bom Deus a haverá de proteger para que eu não a veja morrer. Isso só poderia acontecer por mãos humanas; isso eu rogo ao Grande Senhor para que não permita, jamais. Quando eu tiver que partir, quando os Poderes do Alto tal houverem por bem decretar, quero partir com a certeza de que ela, "minha" paineira, me sobreviverá. Ela permanecerá, para além de mim e de nós ... Ela permanecerá. Amém.

          Seja como for, espero ainda viver... Espero ainda  encontrar o possível dos sentidos que me faltam... Encontrar, ainda, o possível da vida a viver... Por enquanto, o único real e efetivo sentido é minha mãe e sua necessidade de mim... Preciso dela também, claro, mas, preciso de algo mais... Preciso ainda, (do que me for possível e lícito) de mim mesma. Preciso ainda do que me for possível e lícito de mim.  Preciso ainda de uma de mim que me possa voltar; de alguma de mim que ainda me possa, o possível, ser. Para além da escrita, ainda... Para além da escrita... Tomo a presença da minha paineira, por ora em seu ciclo invernal, como minha  testemunha imediata, a testemunha imediata desta espécie de oração. Seja minha testemunha, sempre, paineira bem-amada; bem-amada paineira, sempre: seja minha testemunha.