AS RELAÇÕES EXTRACLASSES (A céu aberto, Deus era testemunha.)
Era uma tarde de julho como tantas outras. O sol se punha lentamente, pintando o céu com tons de laranja e rosa, enquanto eu caminhava de volta para casa após meu exercício diário. Meu corpo estava cansado, mas minha mente inquieta, ansiosa por algo que eu ainda não sabia definir.
Foi então que os vi na "Praça Criativa" - um grupo de jovens alunos meus, brilhantes e cheios de potencial: Rodrigo, Nádila, Lucas, Karlos, Josué, Marcos Antonio e Eduardo. Seus olhos brilhavam com uma curiosidade que me lembrou de mim mesmo quando jovem. Aproximei-me para cumprimentá-los, sem imaginar que estava prestes a embarcar em uma jornada filosófica que duraria horas.
"Professor!", chamou Rodrigo. "Pode se juntar a nós? Estávamos discutindo sobre a existência de Deus."
Como poderia eu recusar? Ali estava eu, qual Sócrates moderno, rodeado por mentes ávidas por conhecimento. O círculo se formou naturalmente, as vozes se elevaram em um debate apaixonado que atraía a atenção dos transeuntes. As horas passaram despercebidas enquanto mergulhávamos em questões profundas.
Rodrigo, que se dizia ateu, surpreendeu-me com sua honestidade intelectual: "Não sou um ateu total. Todos os dias tento encontrar um sinal de Deus, mas infelizmente não o encontro. Busco o conhecimento para entender os dois lados." Sua reflexão abriu caminho para discussões sobre temas controversos como sexualidade e religião.
A mente fértil desses adolescentes me impressionava a cada momento. Questionaram a lógica por trás da Arca de Noé, indagando como Noé, um idoso, poderia descer o Monte Ararate, tarefa difícil até para alpinistas profissionais. Desafiaram conceitos preestabelecidos sobre pecado e amor, provocando com perguntas como: "E quem faz sexo com a cabra é bode também?"
Foi então que percebi: ali, naquela praça, sem planos de aula ou recursos didáticos, estava acontecendo a verdadeira educação. Não era eu quem ensinava, mas sim um facilitador de um diálogo socrático que permitia que esses jovens explorassem suas próprias ideias e convicções.
O céu escureceu, as estrelas começaram a pontilhar o firmamento, mas o brilho nos olhos daqueles jovens não diminuía. Testemunhei algo extraordinário - a pura sede de conhecimento, livre de obrigações ou autoritarismo.
Essa experiência provou que quem faz a escola é o aluno. Tivemos uma aula de filosofia intertemática sem nenhum recurso didático formal. Bastou-me apenas o domínio de minha matéria de estudo e o método socrático dos questionamentos.
Enquanto caminhava para casa, refletia sobre como a educação poderia ser transformada se capturássemos a essência daquela didática. Se pudéssemos trabalhar os jovens no tempo da vida, no espaço da vida, com conteúdos da vida. A verdadeira educação não acontece apenas dentro das paredes de uma sala de aula, mas em cada momento em que estamos abertos a questionar, aprender e crescer.
Naquela noite, sob o céu estrelado, senti que havia recebido uma lição preciosa de meus próprios alunos. E quem sabe, talvez Deus estivesse ali conosco naquela praça, não como um tema de debate, mas como testemunha silenciosa de mentes jovens florescendo em busca da verdade. Afinal, como dizia Einstein, a única certeza que temos é a singularidade do indivíduo.
ALINHAMENTO CONSTRUTIVO
1. Como a discussão sobre a existência de Deus e a busca por sinais de sua presença pode influenciar a formação das crenças e valores dos jovens em um ambiente educativo informal?
2. De que maneira o debate na "Praça Criativa" ilustra a importância de uma abordagem educacional intertemática e participativa na construção do conhecimento entre alunos do Ensino Médio?