TEMPOS DE PUC



 
      Em meados da década de 1980, mais precisamente em 1985 eu, que há dez anos estudara Letras na USP e já exercia o magistério na Rede Municipal de Ensino, resolvi tentar viver o grande sonho de estudar Filosofia. Como já havia feito curso superior, entrei na PUC sem prestar vestibular. E lá estava eu, onde sempre quis estar, realizando um sonho nascido ainda na adolescência. Guardo, passados tantos anos, a lembrança das aulas do Professor Benjamim, monge beneditino, que nos deu aulas de Filosofia Antiga e Medieval. Seu olhar, sua palavra, brilhantes de paixão pelo Conhecimento  e pelo Saber nos contaminavam, nos conduziam a um universo mágico - a procura do conhecimento pode se tornar tão mágica quanto a procura e a vivência do amor. Ao menos para seres como eu.
      De todo modo, não pude viver este sonho plenamente, como jamais pude realizar em plenitude nenhum dos meus outros sonhos. Exigências dramáticas da vida imediatamente real me obrigaram, mais uma vez, a desviar o foco de uma necessidade e escolha minha   para servir  à necessidade de seres amados. Mais uma vez...  mais uma vez... Destino é destino e a Lei do Serviço é, muitas vezes, demasiado implacável... e inescapável - Há casos em que esta Lei não nos permite trégua nem fuga de nenhuma espécie... de espécie nenhuma... E assim tem sido sempre. A responsabilidade? Minha e de  fados - leia-se destinos - espantosos... espantosos... todos eles, todos.
        Tranquei, em 1987, a matrícula na PUC. Tentei voltar em 1990, mas, aí, definitivamente, não era possível mais, não era possível mais... Aliás, depois de 1990 a vida tornou-se, mesmo, Outra... Outra... e inexplicável, tempos de toda glória e de toda dor; tempos de sentimentos o tempo todo a se digladiarem entre si; tempos de liberdades e de escravidões ; nunca mais nada voltou ao que havia sido até então. Nunca, nunca mais, Mudança que, em verdade, já se havia ensaiado, com violência, em 1984 - de 1984 nada posso falar para além do lançamento do meu primeiro livro de poesia, o "Poemas de Azul e Pedra". Do ano de 1984, só do lançamento desse livro me é possível falar. Ano de apocalipse pessoal. Eu sou, deveras, uma sobrevivente a mim mesma. Há décadas. Para ser bem precisa, há 30 anos. Há 30 longos anos. Uma sobrevivente.