ESTRANHAS VIAGENS
Tinha trabalhado tanto naquela peça... Cada impressão sua ficara ali, em gestos ávidos, ora concebidos pelo que lhe inspirava, ora minuciosamente estudados para dar a falsa impressão do acaso.
Não seria aquela sua primeira, muito menos sua última escultura, mas endereçada que era àquele seu amor desvairado, com certeza já nasceria com honras de uma obra-prima.
A peça chegou ao seu último retoque e foi entregue em grande estilo... A paixão ainda durou uns bons meses de juras de “pra sempre”... mas, naturalmente acabou...
Uns vinte anos se passaram e recebeu uma mensagem inesperada de um amigo, testemunha ocular dessa época de suspiros. A tal escultura foi vista perambulando num brechó barato...
Estranhas viagens fazem os objetos quando perdem seus donos, pensou, dando de ombros, enquanto tratava de moldar a argila que impaciente aguardava um carinho...