João Ubaldo Ribeiro

Parto para o sacrifício. Conscientemente.

Adoro e leio as crônicas de Ubaldo. Direto, objetivo, sempre seguindo linha própria e inteligente. Não é assim com o autor romancista, e tenho a coragem de afirmar isto. Vamos com paciência e por partes.

Os livros por ele publicados têm muitos falsos pecados. Mesmo “Memórias do Sargento Getúlio”, que me parece o mais simples de ser entendido, dá trabalho ao leitor.

O meu caro literato prima por ser prolixo e confuso, embora muito rico. Seus romances, quase sempre, afastam o leitor contemporâneo, que admira a clareza e repudia o gongorismo. Assim é que Ubaldo, talvez querendo bater “Casa Grande e Senzala”, de Gilberto Freire, escreveu “Viva o Povo Brasileiro”, um livro muito ingrato de ser apreciado. Dito como um dos mais importantes livros da literatura brasileira é difícil de ser lido.

Complicado na linguagem, que Ubaldo teima em usar, talvez pela sua forte influência de Vieira. Com custo, para estudo somente, o livro é lido por causa dos comentários que recebeu. Precisa de uma dose de paciência muito grande para ser digerido. Por cima de tudo, com mais de setecentas páginas. Um abuso literário, dos maiores. Ao mesmo tempo, fabuloso. Entenda-se!

Dirão todos: “um cronista idiota querendo criticar um de nossos grandes autores.” Não! Pretendo apenas falar, dizer que respeito profundamente João Ubaldo Ribeiro, mesmo em “Viva o Povo...” Li todo, à custa de sacrifício, que o autor poderia me ter poupado. Não seguiu as sagradas regras, atrapalhou tudo e criou um livro para intelectuais, mas riquíssimo.

Talvez seja idiotice minha, admito. Mas, no momento, quero ver quem encara um tijolo daqueles sem reclamar.

O exagero de Ubaldo é a simplicidade de Guimarães Rosa e Jorge Amado. A simplicidade e objetivo acima de tudo. Acaso isso diminui o autor? De modo algum. Literatura é assim mesmo, quando é de qualidade. Ninguém lê os Irmãos Karamazov impunemente. Dostoievsky é autor difícil, escreveu numa época em que o mundo não tinha pressa. Quando digo chato, quero me referir a difícil.

Ubaldo ganhou o prêmio Camões, o maior da língua portuguesa. Não teve dúvida em afirmar que “se ganhei é porque mereci”. Como mereceu, João, como mereceu...