Carta aberta ao ano 3000
Oi.
Meu nome é Gabriel e recém começamos os anos 2000 do calendário cristão.
Não acredito que essas palavras chegarão a você, leitor do ano 3000, que é para quem eu escrevo. Por diversos fatores. Primeiro, pela prepotência em escrever no idioma português-brasileiro. No momento, o idioma mais falado do mundo é o mandarim. Pudera, 1/7 da população mundial é chinesa. É possível que aí no seu presente este seja o idioma oficial mundialmente e as outras línguas se rebaixaram ao posto de dialetos locais. É possível, ainda pelo mandarim universal, que o tipo de escrita alfabético deste texto entre em desuso e a comunicação por símbolos que representam ideias tomem seu lugar. Segundo, porque estou escrevendo na internet. Na virada do ano de 1999, não sei se vocês se lembram ou se chegaram a conhecer, houve o chamado “bug do milênio”, que na verdade não existiu, mas era um receio de que a tecnologia se acabasse devido à mudança milenar e a contagem do tempo em computadores. É capaz que aí na frente vocês tenham outra tecnologia e essa revolução de hoje conhecida como Internet pode ter se esgotado ou ficado ultrapassada a ponto de ninguém mais usar. Outro motivo pelo qual essa carta pode não chegar a vocês seria se eu saísse do meio virtual, escrevesse num papel e enterrasse em algum lugar. O papel se deteriora, nem plástico dura tanto tempo. E nem assim se teria a certeza de que chegaria em suas mãos. Uma opção seria expor num museu, mas ninguém teria tanta devoção para guardar essas parcas linhas durante tanto tempo. Até porque, hoje mesmo museus são poucos e as pessoas vivem tão apressadas que não se importam mais com eles. Supondo que vocês aí saibam o que é um museu.
De qualquer forma, eu venho aqui porque eu posso escrever, independente de ser lido ou não. E caso vocês leiam, favor pipocarem aqui através de uma máquina do tempo até o final desse texto ser escrito, revisado e postado. Ou seria exagero pensar numa máquina assim? Num teletransporte? O homem vem sonhando com isso faz tempo mas ainda não tivemos sucesso. Espero que vocês consigam, seria algo que facilitaria muito no cotidiano. É péssimo ser escravo da geografia.
Talvez eu seja um otimista em pensar que existirá raça humana daqui mil anos. Eu me peguei pensando que ela pode acabar consigo mesma, a priori, por causa de guerras, ponto alto do milênio passado. Mas pensando melhor, existem outros fatores que estão por vir, como doenças e epidemias. O ebola está em alta matando muita gente na África. A AIDS foi descoberta e popularizada há poucas décadas e existe um esforço para se controlar a doença, acredito que pelo menos até o final deste século já tenham encontrado uma cura. E então, outra doença pior pode vir. Vira e mexe aparece notícia de um “super-vírus” criado em laboratório. Outro grande motivador de mortes ainda é a religião. É incrível como, em pleno 2014, ainda se mate e se morra por isso. Religião vem matando desde milênios antes de Cristo e ainda mata. Agora mesmo a Palestina e o Afeganistão estão em ruínas. Espero que essas palavras não sejam estranhas a vocês: Cristo, Palestina, Afeganistão. Os países mudam de nomes, se dividem, se anexam, se criam, se destroem. Religiões são milenares, mas nada impede a criação de uma nova. Quem sabe? Se forem criar, tentem fazer uma que não seja necessária a morte de outros para se reafirmarem como correta em seu ponto de vista.
No parágrafo anterior eu olhei para o passado distante, mas nesse aqui, vou pegar apenas o milênio anterior, que compreende os anos 1001 até 2000. Uau, quanta coisa aconteceu. O declínio do feudalismo, cavalarias, idade média, Cruzadas, Renascimento, colonização da América, globalização, capitalismo, revolução industrial, tecnologias. A impressão que eu tenho é que em 12 anos do terceiro milênio se vive muito mais do que nos do segundo. É por isso que os anos passam voando e a gente nem percebe. Os dias são intensos e existe uma torrente de informações por todo lado. Antes, o conhecimento era escasso, hoje, é abundante e se conhece um pouco de tudo, mas sem ser suficientemente profundo para exercer trabalho com ele. Ainda assim, as pessoas insistem em usar esse pouco conhecimento em tudo para opinarem até em coisas que não sabem. Todos fazem isso, eu inclusive estou fazendo aqui mesmo nesse texto. Se hoje tem quem mal aguente o excesso de tudo, eu quero acreditar que daqui mil anos os nossos cérebros expandir-se-ão para dar conta. É necessário.
Um período que eu gosto bastante do milênio passado é o do renascimento italiano. Eu fico embasbacado, saíram de um período sombrio e de grande repressão, principalmente por causa – de novo – de religião para então haver uma explosão de ideias, artes, tecnologias, pinturas, estátuas, arquiteturas, filosofia. A mente humana pôde alçar voos como nunca antes. Voou como Leonardo da Vinci sonhou em seus protótipos de aeroplanos e que apenas séculos mais tarde vieram a se desenvolver com os irmãos Wright e o Santos Dumont. Certamente, eram homens visionários. Eu não sou, mas o meu ponto é que sempre existirão pontos assim, fascinantes, emocionantes para a raça humana vindos de pessoas geniais. Não é possível que tudo fique virtual e as grandes conquistas sejam online.
Talvez um grande triunfo ainda por vir seja a mudança para outros planetas habitáveis. Eis mais um motivo pelo qual não adiantaria enterrar esse texto, é capaz que o planeta Terra se esgote e a raça humana venha a habitar outros planetas, galáxias e, quem sabe, até mesmo chegar ao fim do universo. Quem sabe nos encontremos com outros seres vivos. Atualmente essa é uma opinião que divide as pessoas, mas, sendo o universo tão absurdamente grande é egoísmo pensar que estamos sozinhos nele num planetinha tão ínfimo como este. E é olhando para a amplitude do universo que eu penso em coisas como teoria das cordas, buracos negros, dimensões paralelas. Essa parte da ciência ainda é recente e igualmente fascinante. Hoje temos mais perguntas do que respostas, arrisco dizer, na minha ignorância opinativa citada parágrafos atrás, que é um ramo mais filosófico do que fisicamente comprovado. O que não é um problema, acredito que a base da humanidade seja a filosofia. Desde milênios anteriores, como no caso da Grécia antiga, até o renascimento citado, até mesmo hoje em dia; sempre existem pessoas propondo jeitos de se olhar as manifestações humanas, o jeito como elas funcionam. Da mesma forma que hoje nós olhamos o espaço e levantamos as nossas ideias. Repito, é a base de tudo. Em mil anos muito há de ser descoberto. Eu conto com vocês.
No fim das contas eu poderia me demorar linhas, páginas, poderia escrever um livro inteiro sobre como, dado um lugar na história, se olha o passado e como se olha o futuro. Não é esse o intuito, até porque se hoje na internet as pessoas já não leem muito mais do que 140 caracteres eu imagino como vocês leriam isso. Quero acreditar que pelo menos alguém se dará ao esforço. Talvez eu seja mesmo um otimista.
De qualquer forma, não vou me estender. Um século é relativamente pouco, uma pessoa já vive cem anos, em média, e esse número tende a aumentar com o passar da medicina. Passa num piscar de olhos. A vida passa abruptamente. Mas dez vidas uma atrás da outra, século atrás de século, aí fica grande demais a ponto de eu me perder de vista. Porém, sugiro a ideia para quando vocês se encontrarem no começo dos anos 3000: é interessante fazer um levantamento do milênio anterior e o que esperar do próximo que está por vir.
Nos vemos no ano 4000, então.
-G-