Até o chocolate da Alemanha
Sou liberado do serviço na hora do almoço: é dia de jogo do Brasil. Botei 2x0 para a Alemanha no bolão, mas ainda acalento tímidas esperanças de vitória brasileira. Quem sabe? Tem acontecido tanta coisa nessa Copa. Chego em casa e a minha vizinha de quarto, uma senhora de meia idade, aparece e diz que, se eu quiser, posso assistir ao jogo com ela. Ela, que nem gosta de futebol, deve ter percebido que assisti a todos os jogos sozinho no meu quarto, mas é justamente assim que eu gosto de assistir. Agradeço o convite, mas não aceito.
Tenho ainda um bom tempo antes do jogo – é hoje, Fred! Decido desligar todos os aparelhos, deitar na cama e ler, entrar em outro mundo, esquecer totalmente a partida de logo mais. Relaxo, chego a cochilar, mas sou acordado pelo barulho no quarto ao lado. Ninguém está morando lá e Dona Lúcia resolveu fazer uma faxina bem na hora do jogo. Não gosta muito de futebol, assim como a diarista que veio ajudar. Suspiro, levanto-me, ligo a TV, canto o hino nacional (mentira, não canto) e espero a bola rolar.
Nos primeiros cinco minutos, eu berro: "A Alemanha está com medo do Brasil! Nem o tiro de meta eles chutam pra frente". Só que logo acontece o primeiro gol alemão. Xingo, reclamo, mas ainda acredito. Vem o segundo e eu largo os pontos - sinto cheiro de goleada. E ela vem: três, quatro, cinco... Meu Deus, desde a Segunda Guerra que os alemães não praticavam uma blitzkrieg assim. Desejo que os brasileiros caiam, simulem contusão, abandonem o jogo, qualquer coisa.
As mulheres ao lado me perguntam quando está o jogo. Também penso em cair, simular um ataque epiléptico, mas não responder. O pior é que o jogo ainda não acabou. Penso no Barbosa e na seleção de 50: todos redimidos. Dona Lúcia diz que depois que acabar o jogo vai querer a minha ajuda para colocar umas cortinas. No 7x0 elas voltam a me perguntar quanto está. Exerço o meu sadismo: "Adivinhem". Mas eu não podia esperar a noite inteira até que elas acertassem.