A pátria continua sendo de chuteiras
Há exatos 50 anos o Brasil vivia o início de um período marcado pela repressão, pela censura e por diversos episódios de tortura. Foram anos regidos por vozes que cunhavam o despotismo tirânico de mentes extremamente centralizadoras. Aqueles que eram contrários àquelas vozes eram sagazmente punidos. Ou por vias físicas ou por psicológicas, eram submetidos ao temor dos militares.
Sobrevivemos a tudo isso com sequelas ainda evidentes; aliás, já havíamos nos acostumados com os estigmas deixados pelos nossos “patrícios”, que há exatos 514 anos nos “descobriram”. Carregamos uma imagem corrupta, mas ao mesmo tempo acolhedora. Temos em nosso nascimento a marca de uma nação nua, sem caracteres próprios, um aglomerado de etnias, e todos os paradoxos tupiniquins.
Cansamos de assistir, atônitos, novelas tragicômicas; e ainda assim mantemos o nosso bom humor. Acordamos por diversas vezes com a impressão de nunca termos adormecidos e com as mesmas impressões de outrora. Somos, com todas as analogias, “macunaímas”: vivemos na expectativa de estarmos à rede, deitados a sonhar com “vintém” e amamos a “vagabundice” necessária.
Numa epígrafe das famosas crônicas de “Pátria de chuteiras”, Nelson Rodrigues diz “somos o povo que berra o insulto e sussurra o elogio". Àquela época, a crônica “O escrete precisa de amor” discorria sobre a necessidade de a nação deixar evidente que éramos o melhor time de futebol do mundo. Sugere ainda que o Maracanã, palco de diversos espetáculos, cale a vaia e faça vigorar o grito de uma nação acostumada a dar a volta por cima, a mostrar-se “onipotente”. De fato, Nelson Rodriguez profetizou o tricampeonato com a alcunha de que tínhamos a necessidade de sermos um todo, e não apenas um escrete com onze cidadãos brasileiros. E deu certo!
Hoje, amanhecemos tristes por termos perdido a oportunidade de firmamos a nossa onipotência dentro de casa. Mas não podemos esquecer o coro do nosso Hino, cantado à capela, ecoando ainda em nossos ouvidos.
Não temos que ter vergonha de mostrarmos as nossas fraquezas, os nossos deslizes. Temos que ter a grandeza de agirmos como “vencedores”, pois de fato somos. Afinal, não foi à toa que bordamos cinco vezes a estrela em nosso peito: não há pentacampeões por sorte, mas sim por competência!
Todos nós fomos convocados juntamente com os onze jogadores que ontem abaixaram suas cabeças, e é na condição de sermos o décimo segundo em campo que encerraremos mais uma Copa. Não deixemos que a vaia prevaleça, ofusquemô-la com o nosso grito de sermos “brasileiros com muito orgulho, com muito amor”.
* Sem revisão!