Uma plateia heterogênea lota o grande teatro. Crianças, mães, avós e tios compõem a grande maioria naquela festa de encerramento do ano letivo. A escola de ballet é só para crianças. A cada apresentação seguem-se os aplausos. Algumas lágrimas de orgulho e emoção correm pelas faces dos familiares. Bailarinas de perninhas finas e longas, parecendo garças brancas, deslizam na ponta dos pés, em passos graciosos. Mais de trinta crianças exibem suas habilidades. Umas são melhores, outras piores, mas aos olhos dos parentes, todas têm possibilidade de se tornarem primeiras bailarinas do Municipal. Um jovem, muito bem vestido, chega ao microfone e avisa que, para encerrar o espetáculo daquela noite, as crianças iriam dançar todas juntas, em homenagem aos professores. Ao final do espetáculo, os aplausos esperados. Os pequenos pássaros brancos, com os coraçõezinhos ainda acelerados pela emoção, vêm ao encontro de seus familiares, que não se cansam de elogiar tão maravilhosa atuação. Acabou o sonho, é hora de voltar para casa. À porta do teatro um carro luxuoso espera Vanessa, que vem descendo as escadas pela mão da mãe, usando ainda o seu traje de bailarina. Antonio, o motorista, quer saber das novidades e Vanessa não poupa elogios ao espetáculo e a si mesma. Na porta do teatro uma outra menina que, por acaso, também se chama Vanessa, com o cabelos raspados e usando uma saía estampada, mas parecendo um trapo sobre o corpo, vende balas. Ela e o irmão, pouco menor, observam a Vanessa bailarina, nos seus passinhos delicados. Os dois se entreolham, colocam as caixas de balas no chão e saem a bailar, rodopiando pela calçada, sorrindo, esquecidos da pobreza. Esperam os aplausos dos transeuntes que passam sem se sensibilizarem com a arte dos dois grandes bailarinos.